O LMV em detalhes – parte 2
Por Guilherme Poggio
Pioneirismo
A IVECO foi uma das empresas pioneiras em apresentar um veículo sobre rodas leve, fortemente protegido e focado na sobrevivência dos seus ocupantes. Os primeiros rascunhos do que seria futuramente o LMV (Light Multirole Vehicle) surgiram ainda no ano de 1999, muito antes da invasão do Afeganistão e da segunda guerra no Iraque, quando ataques por IED (Improvised Explosive Device – artefato explosivo improvisado) destruíram dezenas e dezenas de veículos leves e seus ocupantes, atraindo a atenção dos comandantes e da mídia.
O programa inicial de desenvolvimento foi financiado com recursos da própria companhia. Muitos componentes COTS (Commercial Off-The-Shelf” – de pronto uso) foram empregados para reduzir custos e prazos. Como exemplos de componentes COTS temos a transmissão e o motor. Os primeiros dez protótipos ficaram prontos no ano de 2001 e foram expostos primeiramente durante a Eurosatory de 2002. A designação inicial do fabricante é M65, mas o acrônimo LMV acabou se popularizando.
Em 2003 o LMV foi declarado vencedor da concorrência britânica FCLV – Future Command and Liaison Vehicle. Foi naquele mesmo ano que o Exército Italiano formalizou o contrato para as primeiras 60 unidades. Depois dessas encomendas iniciais o número de pedidos escalou exponencialmente: até 2018 a IVECO havia comercializado mais de quatro mil veículos da família LMV para mais de 15 operadores.
No ano de 2010 a IVECO apresentou a versão A1 que incorporava muitas das duras lições aprendidas no teatro de operações do Afeganistão. Esta versão possuía célula de sobrevivência aprimorada, escotilha adicional no teto, capacidade de operar com estações de armas remotas, novos assentos para a tripulação e outros recursos.
Outras evoluções ocorreram nos anos seguintes, como melhorias na parte mecânica para elevar a confiabilidade e o desempenho fora-de-estrada, o redesenho da ergonomia interna e o aumento da carga útil transportada. Não há uma definição oficial, mas é costume falar em quatro grandes evoluções do projeto, além das que cada cliente especifica conforme suas necessidades.
LMV2
Atualmente a IVECO possui duas gerações do LMV em produção: a versão padrão, que sofreu evoluções e modificações com o tempo, e o modelo LMV2, o mais atual do projeto. Externamente o LMV2 é muito semelhante ao tipo padrão, porém, ele é mais pesado (8,1 toneladas contra 7 toneladas do padrão), ligeiramente mais comprido, possui maior proteção (a placa blindada sob a célula de sobrevivência foi reformulada) e carrega mais carga útil.
Há também diferenças pontuais na parte externa como novos estribos, dobradiça adicional nas portas, maçanetas novas e presença de um pneu reserva na parte traseira. No entanto, o preço do LMV2 chega a meio milhão de euros por unidade. Como comparação, vale lembrar que mencionamos, na parte anterior desta matéria, que o preço básico do LMV padrão, encomendado pelo Exército Brasileiro (EB) é de 1,5 milhão de reais por unidade.
Lançado em 2016, o Exército Italiano já encomendou 32 unidades, sendo que o primeiro deles foi recebido em dezembro passado. Recentemente (agosto de 2019) as Forças Armadas Holandesas publicaram em seu twitter que serão adquiridos veículos LMV em cinco diferentes variantes que incluem as versões ambulância e com estação de armas remota. Eles substituirão diversos modelos, incluindo o Mercedes 290GD, 280G, e Landrover.
O modelo definido pelo EB para o programa VBMT-LR, como dissemos, é o LMV padrão, mas mesmo essa versão incorpora melhorias recentes.
Célula de Sobrevivência
Olhando o LMV externamente ele parece somente mais um veículo fora de estrada, voltado para uso militar. Um verdadeiro “jipão”! Mas, na verdade, o seu projeto não tem praticamente nenhuma semelhança com os SUV 4×4 civis, encontrados em diversas concessionárias de veículos.
Trata-se de uma viatura desenhada para estar na linha de frente. E, como tal, precisa garantir que sua tripulação permaneça viva para cumprir a missão. O foco central do desenvolvimento do veículo visou a segurança dos seus ocupantes, sendo o construído em torno da célula de sobrevivência.
Grande atenção foi dada às ameaças provenientes de minas terrestres e IED. Para veículos leves, como o LMV, os efeitos da explosão desta classe de artefatos devem ser mitigados pela dissipação da onda de choque. A grande distância do chassi em relação ao solo, assim como o assoalho composto por uma estrutura de multicamadas (que procuram absorver tanto as ondas de choque como os fragmentos) são características do projeto do LMV que contribuem para a sobrevivência da tripulação frente a minas menores. Já para minas anticarro o veículo conta com uma placa blindada em forma de “V”, abaixo da célula de sobrevivência (detalhes sobre a blindagem serão vistos mais adiante).
A energia residual que não for dissipada terá que ser absorvida. Sendo assim, a célula de sobrevivência é totalmente dissociada dos demais componentes do chassi. Falando em chassi, os componentes da transmissão e suspensão estão posicionados, dentro do possível, em locais mais distantes da tripulação. O objetivo é que esses componentes, geralmente pesados, não venham a ser causas secundárias de ferimentos aos tripulantes, caso essas peças sejam deslocadas por motivo de uma explosão.
Na parte frontal o capô do motor está fixado ao chassi e não à célula de sobrevivência. Já o tanque de combustível localiza-se bem na traseira do veículo, sob o compartimento de carga, ficando o mais distante possível da tripulação. Em caso de explosão do tanque de combustível a energia liberada será direcionada para fora do veículo.
O tanque de combustível ainda comporta espuma supressora de explosões. Adicionalmente, o bocal de enchimento encontra-se posicionado distante das portas para reduzir o risco em caso de incêndios.
Todos os cinco ocupantes possuem assentos desconectados do piso, evitando assim efeitos diretos das ondas de choque sobre a coluna vertebral. Os cintos de segurança são de padrão aeronáutico de cinco pontos, com fivela central para reduzir os efeitos primário (movimento de subida brusco) e secundário (movimento de descida brusco) das ondas de choque, assim como possíveis “G” negativos. Além disso, os apoios de cabeça são envolventes e ajudam a reduzir lesões causadas pelo “efeito chicote” provenientes de explosão de IED em beiras de estradas.
Para ler os textos anteriores clique nos links abaixo
Nos textos seguintes o “Forças Terrestres” trará mais informações sobre o projeto do LMV.
O editor Guilherme Poggio viajou a Sete Lagoas a convite da IVECO/CNH.
Ótimo projeto!!! O EB precisa no mínimo de uns 300 desses !!!
“até o momento o único cliente do LMV2 é o Exército Italiano, que encomendou 32 unidades” Pensei que tanto o exército, como os marines holandeses tinham encomendado a versão LMV2
Bem lembrado, Junior. Anúncio feito em agosto passado. Coloquei o link no texto. Muito bom ter leitores sempre atentos.
Ótima série, eu só acho que abaixo da foto do Humvee destruído poderiam colocar a de um LMV também atingido por IED. Seria perfeito para mostrar o diferencial entre os dois veículos. O LMV não é invulnerável, mas a chance de se sair vivo depois dele ser atingido é bem maior.
Calma Renato B. Vai ter muita foto de LMV em combate ainda. Nada de spoiler, por favor!
Maravilha, um veículo e tanto, bem mais recente que o Humvee e mais capaz, que mesmo não chegando aos tais possíveis milhares , que ao menos cheguemos a umas três ou quatro centenas.
Esta parte da matéria talvez ajude a dissipará uma suposta lenda:
5) Os britânicos venderam seus LMV por ruins.
Na verdade, foram comprados em 2003 (mais de 15 anos) quando ainda o conceito estava se difundindo. A partir da guerra do Iraque é que sua necessidade ficou patente.
A versão britânica ainda era a primeira, com muitos componentes do mercado civil.
O LMV brasileiro, apesar de ser da primeira versão, já incorporou no mínimo 3 ciclos de aprimoramento.
Muito boa matéria!!!!
Carvalho, o caso britânico vai além disso (problemas de início de projeto). Pediram o veículo errado para a função errada. Enfiaram um monte de equipamentos neles que não comportavam. O carro ficou apertado para quatro ocupantes. Acho que eles precisavam de um Dingo II ou algo até maior. Só que um Dingo II custa o dobro do LMV.
Muito bem esclarecido, Poggio.
Pq não já a versão LMV2…..
Penso que seria um gasto inicial que se diluiría ao longo dos anos….
Mas mesmo assim, é um excelente veículo blindado.
essa ideia de só a cabine blindada foi mto boa durante a segunda guerra nos aviões sovieticos do modelo IL, acho que o sucesso deles se deu por conta disso.
existia um casulo blindado que ja fazia parte da carenagem da aeronave onde ia o piloto e o artilheiro de calda