Por Claudia Cataldi
Jornalista. Mestre em Ciência Política e Presidente da Associação Brasileira de Imprensa de Mídia Digital e Eletrônica – RJ

1. Introdução

Vivemos uma era de transformações sem precedentes, em que a introdução de tecnologias avançadas revoluciona cada aspecto da nossa existência. A Inteligência Artificial (IA) e a Tecnologia Quântica, em particular, têm desencadeado uma verdadeira metamorfose nos meios de produção, na gestão de negócios, na eficiência e qualidade dos serviços, e na própria dinâmica das interações sociais. Essas inovações, com seu poder quase ilimitado, não apenas redesenham o presente, mas também traçam os contornos de um futuro cada vez mais interconectado e automatizado. É um momento empolgante e crucial, onde a compreensão e a aplicação dessas tecnologias determinam o sucesso e a relevância de nações e organizações em um cenário global em rápida evolução.

Contudo, a tecnologia trouxe consigo novas vulnerabilidades – os dados e as redes tornaram-se alvos de criminosos, terroristas e até mesmo de atores estatais. A inexistência de fronteiras virtuais permite que um determinado sistema de dados possa ser atacado de qualquer ponto do globo, sofrendo altos impactos a baixos custos. Tais ameaças configuram-se em uma nova dimensão: o espaço cibernético. Paulatinamente, os Estados começaram a visualizar a necessidade de se defenderem no ambiente virtual.

Sendo assim, a Doutrina Militar de Defesa Cibernética do Ministério da Defesa, apresenta o conceito de Poder Cibernético como sendo a capacidade de utilizar o espaço cibernético para criar vantagens e eventos de influência neste e nos outros domínios operacionais e em instrumentos de poder (BRASIL, 2014). Dessa forma, ter condições de atuar no espaço cibernético, por meio do uso do poder cibernético, tornou-se um imperativo para aqueles Estados que pleiteiam ocupar lugar de importância no cenário mundial.

Com o avanço da IA e da Tecnologia Quântica, novas oportunidades e desafios emergem no campo da segurança cibernética e da defesa. A IA, com sua capacidade de analisar vastas quantidades de dados em tempo real e aprender com eles, oferece uma vantagem significativa na detecção e na mitigação de ameaças cibernéticas. Sistemas de IA podem identificar padrões de comportamento anômalos e responder a incidentes com uma velocidade e precisão que superam em muito as capacidades humanas.

Por outro lado, a tecnologia quântica promete revolucionar a criptografia, tornando possíveis tanto métodos inquebráveis, quanto técnicas de decifração de código que podem comprometer as formas tradicionais de proteção de dados. A criptografia quântica que utiliza princípios, como a superposição e o entrelaçamento, é capaz de criar canais de comunicação praticamente invioláveis. Um exemplo notável é a Distribuição Quântica de Chaves (QKD), que permite que duas partes compartilhem uma chave criptográfica com segurança, garantindo a detecção de qualquer tentativa de interceptação. Essa tecnologia oferece um nível de segurança que não pode ser comprometido pelos métodos tradicionais de espionagem eletrônica, tornando-a uma ferramenta poderosa para proteger informações sensíveis em um ambiente onde a cibersegurança é de importância crítica.

Já os computadores quânticos trazem neste cenário, um risco significativo para a segurança cibernética tradicional. Com a capacidade de processar informações de maneira exponencialmente mais rápida que os convencionais, os computadores quânticos têm o potencial de quebrar algoritmos de criptografia que atualmente protegem os dados. Isso significa que muitos dos sistemas de segurança digital em uso hoje, baseados em problemas matemáticos complexos que seriam praticamente insolúveis para computadores clássicos, poderiam ser vulneráveis a ataques de computadores quânticos. Essa possibilidade tem impulsionado uma corrida global para desenvolver novas formas de criptografia que possam resistir aos ataques dessas super máquinas, conhecidas como criptografia pós-quântica.

Além das questões técnicas, a adoção e o desenvolvimento da tecnologia quântica têm implicações geopolíticas significativas. Conscientes de que a liderança em tecnologia quântica poderia conferir vantagens estratégicas decisivas, nações ao redor do mundo estão investindo pesadamente em pesquisa e desenvolvimento nesta área,. A corrida tecnológica quântica não é apenas uma busca por avanços científicos, mas também uma competição por poder econômico e militar. Quem dominar essa tecnologia primeiro terá uma capacidade sem precedentes de proteger suas comunicações e dados, enquanto potencialmente compromete a segurança de outros. Esta dinâmica cria um cenário internacional tenso, onde alianças e rivalidades podem ser reconfiguradas com base no progresso tecnológico.

No contexto militar, a tecnologia quântica pode revolucionar não apenas a comunicação segura, mas também a navegação e o rastreamento. Sensores quânticos, por exemplo, podem oferecer níveis de precisão incomparáveis em sistemas de navegação, o que é crucial para operações militares que dependem da localização precisa. Além disso, a capacidade de detecção de submarinos e outros veículos furtivos pode ser significativamente melhorada com tecnologias quânticas, desafiando as estratégias de defesa convencionais. Isso sugere que as Forças Armadas que incorporarem essas tecnologias em suas operações estarão mais bem preparadas para enfrentar as ameaças emergentes no campo de batalha.

Neste cenário, o domínio da IA e da Tecnologia Quântica torna-se essencial para a manutenção da soberania e segurança nacional. Estados que investem em pesquisa e desenvolvimento nessas áreas estarão mais bem posicionados para proteger suas infraestruturas críticas, seus dados sensíveis e suas operações militares. Além disso, a colaboração internacional e o compartilhamento de conhecimentos tecnológicos serão fundamentais para enfrentar as ameaças globais de forma eficaz.

Por exemplo, enquanto países como os Estados Unidos da América e a China correm para dominar a criptografia quântica, há uma corrida silenciosa para garantir que essas tecnologias não sejam usadas para espionagem inversa. A capacidade de criptografar informações com tecnologia quântica oferece uma segurança sem precedentes, mas também desafia a comunidade internacional a estabelecer novos protocolos de confiança e transparência para evitar que essas inovações se tornem ferramentas de manipulação global.

No Brasil, a incorporação da IA  no treinamento militar está redefinindo a preparação e o desenvolvimento de suas Forças Armadas. Sistemas de IA são agora empregados para criar ambientes de treinamento adaptativos que ajustam os cenários em tempo real, com base no desempenho dos soldados. Isso permite uma prática mais personalizada e eficiente, ajudando a melhorar habilidades específicas e a responder a ameaças emergentes com maior precisão sem a necessidade de gastos com armamento real.

Portanto, a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército Brasileiro deve estar na vanguarda da incorporação dessas novas tecnologias, preparando seus oficiais para os desafios e oportunidades que a IA e a Tecnologia Quântica trazem para a defesa e segurança nacional. O futuro da guerra cibernética dependerá da capacidade presente de adaptação e inovação frente a esse atual ambiente, em constante evolução tecnológica.

Referências Bibliográficas:

  1. BRASIL. Ministério da defesa. Doutrina Militar de Defesa Cibernética – MD31-M-07. Brasília: Ministério da Defesa, 2014.

Rio de Janeiro – RJ, 31 de julho 2024.

FONTE: Escola de Comando e Estado Maior do Exército

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Carlos Campos
Carlos Campos
1 mês atrás

Eu acho legal essa atenção, porém o Brasil não tem que eu saiba nenhum projeto de computação quântica ou de super computador, ou se criação de Vírus, tudo que eu lia era mais voltado para defesa cibernetica, não de ataques cibérneticos

Diego Tarses Cardoso
Diego Tarses Cardoso
Reply to  Carlos Campos
1 mês atrás

Temos estudos sim, mas adotar computador quântico é outra coisa.

Nilo
Nilo
Reply to  Carlos Campos
1 mês atrás

Como usuário de acordo com um relatório da consultoria IDC, o Brasil tem a maior taxa de aplicações de tecnologias de IA da América Latina. As estatísticas mostram que 63% das empresas brasileiras usam aplicações relacionadas à IA, superando em muito a média latino-americana (47%).A pergunta que faço é se as Forças Armadas estão inseridas no contexto do 1º Plano Brasileiro de Inteligência Artificial, chamado “IA para o bem de todos”, que estabelece investimentos de R$ 23 bilhões até 2028. Entre as ações sugeridas estão a criação de um supercomputador e de infraestrutura nacional “em nuvem” para armazenamento de dados….… Read more »

Rodrigo
Rodrigo
Reply to  Nilo
1 mês atrás

Nosso sistema bancário é robusto e usa muito de IA, predição de crédito é machine learning ou seja IA. Sobre aplicações quânticas somente Itaú tem time atuando nessa área, mas é conceitual ainda, tem qbits e alguns testes com clusterizacao, mas pouco ainda. Sobre IA usamos muito aquelas validações de imagem, ou seja computer vision, mas sisstema bancario nosso é robusto em IA.

gordo
gordo
1 mês atrás

Não foi aqui que as FAs continuaram comprando um equipamento de comunicação mesmo sabendo que era grampeado? Acho que uma agencia de inteligência era “sócia” da fábrica lá na Suiça.

Willber Rodrigues
Willber Rodrigues
Reply to  gordo
1 mês atrás

Sim, foi a MB, e o equipamento era a Crypto AG.
E lembrando que, mesmo sabendo que a empresa que o fabricava era uma empresa de fachada da CIA, a MB náo viu problrma em usar esse equipamento até recentemente…

Bispo de Guerra
Bispo de Guerra
1 mês atrás

Acredito que antes do fim dessa década computadores quânticos serão disponibilizados para “usuários comuns” , Nvidia esta nessa corrida.

Com o advento “quântico” para as massas … muita pode ser desenvolvido “para o bem e para o mal”…

Algoritmo quântico de Shor pode quebrar (RSA, DSA e ECDSA) ou seja criptografia militar.

p.s- criptomoedas , pessoal que esta nessa vibe , comprar e morrer abraçado com as mesmas..rs…. “abrolhos” … ECDSA usado para assinar transações, uma vez quebrado…quem quebrou assina e limpa a conta…

Last edited 1 mês atrás by Bispo de Guerra
Carlos Campos
Carlos Campos
Reply to  Bispo de Guerra
1 mês atrás

Acho que essa disponibilização será do tipo de computação em nuvem

Bispo de Guerra
Bispo de Guerra
Reply to  Carlos Campos
1 mês atrás

Creio que também poderá vir via uma “espécie” de GPU…

Uma GPU atual RTX4090 processa mais de 1300 AI TOPS(trilhões de operações por segundo) …

Falando em nuvens…A AMD “ventilou” que há conversas sérias da construção de centros computacionais de AI com 1.2 milhões de núcleos GPUs*… chatGPT-3 nasceu com o uso de algo perto a 20.000 🙃

*GPUs para datacenter AI são muito mais poderosas que as “caseiras” tipo RTX…p.ex: uma AMD MI300x tem 5200 AI TOPS (INT8).

Bigliazzi
Bigliazzi
Reply to  Bispo de Guerra
1 mês atrás

A IBM e Microsoft estão liderando esse processo, já trabalham com governos e instituições privadas (Bancos entre outras) para a criação de chaves de segurança e modelos de criptografia quântica. Segundo a Microsoft um computar quântico poderá ser comprado por US$1.0 Milhão de dólares, será uma pechincha, os cuidados serão redobrados pois “governos bandidos” e propriamente “Bandidos” serão os primeiros clientes dessas maquinas. você tem alguma dúvida que o PCC teria US$1.0Milhoes para pagar a vista uma traquitana dessas???

Bispo de Guerra
Bispo de Guerra
Reply to  Bigliazzi
1 mês atrás

Grupos criminosos obviamente tentarão se beneficiar dessa tecnologia, normal, vide as criptomoedas usadas para lavar $$$.

Novas formas de criptografias, usando a computação quântica surgirão.

Já há trabalho nisso usando o 𝐞𝐦𝐚𝐫𝐚𝐧𝐡𝐚𝐦𝐞𝐧𝐭𝐨 𝐪𝐮â𝐧𝐭𝐢𝐜𝐨.

O qual abre as portas para o teleportação quântica e uma das mais intrigantes possibilidades quânticas a 𝗻ã𝗼-𝗹𝗼𝗰𝗮𝗹𝗶𝗱𝗮𝗱𝗲 (a informação sobre o estado de uma partícula parece ser instantaneamente transmitida para a outra partícula, sem importar a distância que as separa) explodindo de vez a teoria que nada pode ser mais rápido que a luz. 🙃

Jose Carvalho
Jose Carvalho
1 mês atrás

Basicamente foi escrever Quantum ou quantico na frente de tudo o que o Brasil queria ter, mas não tem.