Por Eduardo Freitas Gorga

Na época do Natal uma dúvida que pode persistir entre militares em confrontos, bem como os seus familiares, é se está previsto algum tipo de interrupção dos conflitos, seja por razões religiosas ou sob amparo do Direito Internacional Humanitário. Nas guerras as tréguas natalinas são fatos históricos episódicos e, sobretudo, notáveis, se comparados com o caos das atrocidades cometidas, a partir das determinações emanadas pelos altos escalões políticos envolvidos nas contendas. No âmbito do sistema internacional, em ocasiões variadas foram verificadas ações bélicas, contínuas ou descontínuas, decorrentes da data em que é reverenciado o nascimento de Jesus Cristo.

Como exemplo atual, no conflito com os ucranianos, as tropas de Vladimir Putin, presidente russo, receberam ordens para promoverem um cessar-fogo na linha de frente do combate em 6 de janeiro de 2023, por 36 horas, em razão das comemorações do Natal ortodoxo, o que foi negado em dezembro de 2022 mesmo sob apelo internacional. No mesmo sentido, outros fatos mundiais similares podem ser assinalados para ilustrar apropriadamente situações peculiares, certamente inopinadas nos planos de batalha e nas ordens de operações dos chefes militares.

Na segunda metade do século XX, durante a guerra no Vietnã, os militares estadunidenses foram surpreendidos em suas bases com a presença de uma aeronave alusiva ao natal. Um C-7 Caribou foi customizado com pinturas próprias do papai noel e pousou em diversas partes do conflito, muito possivelmente no intuito de elevar o moral das tropas. Em 1971, como singelos presentes de Natal, um tripulante trajado de papai noel, com os seus respectivos ajudantes caracterizados, realizaram entregas de bebidas e sanduíches para os combatentes, além de cartas enviadas por crianças de escolas estadunidenses com dizeres incentivadores aos seus compatriotas.

Por outro lado, anteriormente, no período final da Segunda Guerra Mundial, correspondentes de guerra brasileiros foram alçados ao teatro de operações da Itália, com a missão de realizarem a cobertura dos feitos heróicos da Força Expedicionária do Brasil. Ressalta-se que, em 1944, o natal dos pracinhas foi celebrado com música, regado com vinho italiano, rabanada, peru, castanhas e, obviamente, bombas do inimigo. Desse modo, entre as muitas atividades registradas, esses atos dos bravos febianos são propagados nas rotinas da caserna nacional e, rotineiramente, comemorados no presente pelas Forças Armadas (FFAA) brasileiras.

No transcurso da Primeira Guerra Mundial, militares alemães, franceses e ingleses realizaram uma trégua natalina e cessaram as hostilidades no front belga. Esse evento foi não oficial, durante seis dias de 1914, por iniciativa dos próprios soldados, que inclusive ornamentaram as trincheiras com luzes, comeram, fumaram, brindaram o Natal, cantaram Noite Feliz e saudaram os seus inimigos. De forma destemida, contrariando ainda mais os seus oficiais superiores, eles promoveram uma partida de futebol de confraternização entre os que eram, até então, combatentes rivais.

Nesse contexto, constata-se que o cessar-fogo no período de Natal é um caso simbólico de respeito e humanidade entre os oponentes em combate. Costumeiramente, nas FFAA do Brasil, as festividades de final de ano contam com períodos de dispensas para a tropa, com datas estipuladas e o prejuízo das escalas de serviço, em que pese não ser um direito coletivo assegurado. Assim, os militares deixam de cumprir expediente nos seus aquartelamentos, seja na semana do Natal ou do no Ano Novo, e podem realizar as suas celebrações conforme queiram durante a concessão da dispensa.

Por fim, o sofrimento, a destruição, a violência, a morte e o ódio deixam de ser protagonistas e perdem espaço para a tolerância, a reconciliação, o amor e a compaixão. Sem dúvida, nas festas natalinas, seja na Europa, no Oriente Médio ou em qualquer parte do mundo, se tivessem alternativas, os contendores prefeririam estar em seus lares, trocando presentes e comemorando com os seus familiares, ao invés de estarem sob ordens de realizarem ataques sob bombardeios e hostilidades de inimigos. Portanto, respondendo ao questionamento , convém frisar que armistícios em razão do Natal não são usuais na história contemporânea dos conflitos entre Estados, mas ocorreram, demonstrando que o espírito natalino ainda pode prevalecer sobre os povos.

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lucena
lucena
10 meses atrás

Isso me lembra em confraternização nas empresas…dos 365 dias do ano … tem só um dia…o da confraternização …. só sorrisos e tapinhas nas costas… elogios ao chefe …. mas.. no outro dia..rsrs… é cada um querendo comer o fígado do outro … isso durante os outros dias… do resto dos dias do ano…rsrsr.. que nem nas guerras.

Heinz
Heinz
10 meses atrás

Seria muito bom se tivesse tido uma pausa de natal no front Ucraniano, em Gaza, e no ano novo. Mas o combate ali vai muito além de apenas dois países lutando por algo fútil, é uma guerra de sobrevivência para Israel e a Ucrânia. Infelizmente, é um trágico capítulo na história do mundo, mais um, em que milhares de jovens morrem no calor ardente do combate.
A guerra é algo horrível, quem quiser assistir o filme “nada de novo no front” retrata bem essa realidade.

Wilson Look
Wilson Look
Reply to  Heinz
10 meses atrás

Seu comentário me lembrou de uma música chamada 1916 da banda Motorhead(conheci pela versão lançada pelo Sabaton).

Willber Rodrigues
Willber Rodrigues
10 meses atrás

Considerando-se que ambos os lados, independente do motivo, estão querendo comer o fígado do outro a 2 anos seguidos, duvido muito que o “espírito de fraternização do bom velhinho” permita pausas e confraternizações…
Em Gaza então…vixe.

Wilson França
Wilson França
Reply to  Willber Rodrigues
10 meses atrás

Difícil, dado que nem judeus nem muçulmanos comemoram o Natal em 25 de dezembro.

Fëanor
Fëanor
10 meses atrás

Trégua em guerra contemporânea é descarregar bombas de fósforo branco em posições de combate dos adversários e aguardar que isso os queime.

O lapso temporal da descida desta arma incendiária ao alvo é o tempo da utópica trégua.

Zé Rato
Zé Rato
10 meses atrás

Essa trégua de Natal na Primeira Guerra Mundial foi apenas em 1914. Nos anos seguintes, para evitar a sua repetição, os generais de ambos os lados passaram a ordenar barragens de artilharia sem objetivos militares durante esses dias, para obrigarem os soldados a ficarem abrigados no fundo das suas trincheiras. Também se tornou costume fazer rotação de unidades militares entre sectores diferentes nessa época, para os soldados não ganharem demasiada familiaridade com os inimigos da trincheira à sua frente.

Zorann
Zorann
10 meses atrás

Este caso da ww1, tem um filme sobre o assunto: Joyeux Noël, Feliz Natal (titulo em portugues) filme de 2005. Muito bom