O Exército e a Escola da Guerra no século XXI: o legado de Castello Branco e de Meira Mattos

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Por Maj Daniel Mendes Aguiar Santos

No atual processo de transformação do Exército Brasileiro (EB), o “Plano Estratégico do Exército (2016-2019)” prevê que a Força, até 2022, alcançará uma “nova doutrina”, empregando produtos de defesa tecnologicamente avançados e reunindo profissionais capacitados e motivados ao enfrentamento dos desafios deste novo século, para, assim, respaldar as decisões do País no cenário internacional.

No que tange à educação, o plano tem por objetivo “Implantar um novo e efetivo Sistema de Educação e Cultura”, observando, com ênfase, as seguintes ações: desenvolver a cultura da inovação e da transformação, incrementar a pesquisa científica nos estabelecimentos de ensino, ampliar o intercâmbio com o meio acadêmico e conduzir a capacitação do profissional militar de acordo com as competências necessárias. No que se refere à integração, o plano apresenta o objetivo de “Ampliar a integração do Exército com a Sociedade”, promovendo as ações de elevar o nível de interação da Força com a sociedade, com ênfase nos formadores de opinião; fomentar, com as instituições civis, a pesquisa na área de defesa, entre outras.

Na consecução desses objetivos, “pensar” o Exército torna-se aspecto primordial e, inevitavelmente, reforça a missão da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), que se insere na Diretoria de Educação Superior Militar (DESMil), no âmbito do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx). Fundada em 1905, a então Escola de Estado-Maior foi a célula “mater” da ECEME.

Desde a criação, a Escola emulou as influências das doutrinas militares – alemã, francesa e americana -, até avançar à gênese de uma doutrina autóctone, alavancada pela visão do Marechal Humberto Castello Branco e forjada no âmbito das operações da Força Expedicionária Brasileira (FEB), na Campanha da Itália, durante a 2ª Guerra Mundial, atenta ao fato de que: “Ao chefe militar não cabe ter medo de ideias novas. É preciso, isto sim, não perder tempo, implementá-las e realizá-las até o fim”.

Assim, a partir de 1955, já sob a denominação atual, as missões da ECEME têm se voltado a forjar líderes e chefes militares, formar o oficial de Estado-Maior e o assessor de alto nível, com capacidade de produzir conhecimento e pensar o Exército do futuro.

Inserida no “Processo de Transformação” corrente, a Escola da Guerra expande o seu potencial, exercendo o papel de interface estratégica, contribuindo para a construção de um novo Sistema de Educação e Cultura e para a ampliação da integração do Exército com a sociedade, tendo em vista as demandas do Sistema de Doutrina Militar Terrestre.

Para tanto, a partir de 2014, a ECEME implementou proposta pedagógica assentada no ensino por competências, promovendo a sinergia e a contextualização do conhecimento em prol de uma educação integral. Além disso, avançou na abordagem interdisciplinar do fenômeno da guerra, ao promover uma triangulação metodológica, integrando o consagrado “Método do Processo de Planejamento” (relacionado à resolução de problemas militares), o “Método baseado na Taxonomia de Bloom” (relativo à solução de questões teóricas por nível de desempenho) e o “Método Científico” (aplicado à pesquisa científica) (Nunes; Ramos; Morgado; Gonçalves, 2017).

No que se refere à integração do Exército com a Sociedade, a ECEME tem promovido o diálogo entre civis e militares, por meio do fomento à pesquisa científica, com ênfase na conscientização da sociedade acerca da relevância da temática da Segurança & Defesa. Nesse sentido, em 2001, a Escola implantou o seu próprio programa de pós-graduação. A seguir, em 2002, as Ciências Militares foram inseridas na gama das ciências estudadas no País, integradas à Grande Área do Conhecimento da Defesa e homologadas pelo Ministério da Educação.

Em 2010, o Brasil passou a contar com uma Política de Ensino de Defesa, que instigou iniciativas para difundir a Defesa no meio acadêmico, promover a equivalência de cursos nos sistemas de ensino civil e militar e ampliar o intercâmbio entre instituições de ensino. Pari passu, o Exército iniciou o seu Processo de Transformação, considerando “Educação e Cultura” como um dos aspectos estruturantes. No mesmo ano, a Portaria n.º 734, do Comandante do EB, conceituou as Ciências Militares como o “sistema de conhecimentos relativos à arte bélica, obtido mediante pesquisa científica, práticas na esfera militar, experiência e observação dos fenômenos das guerras e dos conflitos, valendo-se da metodologia própria do ensino superior militar”.

Com destaque, em 2012, foi criado o Instituto Meira Mattos (IMM), cujo nome evidencia a simbiose de um General que foi soldado e cientista, testado no âmbito da campanha da FEB, na 2ª Grande Guerra, e titulado Doutor em Ciências Políticas pela Universidade Mackenzie de São Paulo. Como parte da estrutura da ECEME, o IMM viabiliza a ligação da Escola com as instituições de ensino superior e com os centros de estudos estratégicos, dentro e fora do Brasil. O seu propósito é coordenar e desenvolver a pesquisa científica, fortalecendo a pós-graduação e o estudo das Ciências Militares e da Segurança & Defesa, e criando a oportunidade, integradora, da pós-graduação para civis e militares.

Nesse contexto, em 2013, o Mestrado Acadêmico em Ciências Militares da ECEME, à luz da avaliação na área de Ciência Política e Relações Internacionais, foi recomendado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e, a seguir, aprovado pelo MEC, garantindo a nota três. Em 2015, com o avanço do programa de pós-graduação, deu-se a apresentação da proposta do doutorado e, a seguir, em 2016, o Doutorado em Ciências Militares, que foi aprovado com a nota quatro, amparando a expedição de diplomas reconhecidos pelo MEC e a oferta do curso para toda sociedade (Cunha; Migon, 2018).

Síntese do legado de Castello Branco e de Meira Mattos, o Instituto Meira Mattos é a estrutura da ECEME que “constrói uma ponte” com o meio acadêmico e com os centros de estudos estratégicos. Dessa forma, o IMM contribui para pensar e transformar o Exército, conforme os desafios hodiernos, colimando civis e militares, sob a égide de uma educação integral que avança o “pensar” da Segurança & Defesa. Portanto, a ECEME promove a sinergia do conhecimento factual, doutrinário e científico, contribuindo com a efetividade do Sistema de Educação e Cultura do Exército e com a constante integração da Força com a Sociedade para, em última instância, transbordar dividendos, na forma de militares e civis habilitados a pensar a Segurança e a Defesa do Brasil.

REFERÊNCIAS
_______. 2010. Exército Brasileiro. Portaria do Comandante do Exército nº 734 de 19 de agosto de 2010. Conceitua Ciências Militares, estabelece sua finalidade e delimita o escopo de seu estudo. Boletim do Exército nº 34, 27 ago., 95 pp. Brasília, DF.

_______. 2014. Exército Brasileiro. Doutrina Militar Terrestre (EB20-MF-10.102). Portaria nº 003-EME, de 2 de janeiro de 2014. Brasília, DF.

_______. 2017. Exército Brasileiro. Plano Estratégico do Exército 2016-2019. Portaria nº 1.042, de 18 de agosto de 2017. Brasília, DF.

CUNHA, Rafael Soares Pinheiro da; MIGON, Eduardo Xavier Ferreira Glaser. 2018. Ensino de pós‑graduação no Brasil: as Ciências Militares. Revista Brasileira de Estudos de Defesa, v. 4, n. 1.

NUNES, Richard Fernandez Nunes; RAMOS, Carlos Eduardo De Franciscis; MORGADO, Flávio Roberto Bezerra Morgado; GONÇALVES, Rogério Amorim. 2017. ECEME – A Escola “dos Métodos”. Do ensino integral à educação integrada. A Defesa Nacional. Revista de Assuntos Militares e Estudo de Problemas Brasileiros, n. 834, out./dez.

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Delfim
Delfim
6 anos atrás

“Empregando produtos de defesa tecnologicamente avançados e reunindo profissionais capacitados e motivados”
Isso encaixa no modelo de conscrição ?

Agnelo Moreira
Agnelo Moreira
Reply to  Delfim
6 anos atrás

Perfeitamente.
Vide Israel, Alemanha, Suíça, Rússia, China dentre outros.

Rafael_PP
Rafael_PP
Reply to  Delfim
6 anos atrás

O Exército ainda precisará de carpinteiros, pintores, zeladores, doadores de sangue, etc.

Luciano
Luciano
Reply to  Rafael_PP
6 anos atrás

A oferta do serviço de técnicos na época de formação da FEB foi um dos grandes problemas. Foi muito difícil ter esses profissionais na grande unidade e muita gente foi mandada sem experiência, vide o caso dos acidentes com motoristas.

Delfim
Delfim
6 anos atrás

Com o nível dos conscritos brasileiros ?

Delfim
Delfim
Reply to  Delfim
6 anos atrás

Nível de escolaridade, bem dito. Aqui quem estuda não é engajado.

Agnelo Moreira
Agnelo Moreira
Reply to  Delfim
6 anos atrás

Pelo q sei, depende da Região Militar. Que eu me lembre, na 5ª era 2º grau completo (não sei o nome novo do 2º grau)

Luciano
Luciano
Reply to  Delfim
6 anos atrás

110 anos após a lei de alistamento de Hermes da Fonseca ainda temos problemas com o alistamento. Contudo, naquela época, quase ninguém queria servir, hoje muitos querem servir, porém, como naquele momento, os cidadão mais bem preparados, em boa parte, não têm interesse.

Delfim
Delfim
Reply to  Luciano
6 anos atrás

Então.
Se as FA vão adotar tecnologias além do que quem fez o fundamental, se tanto, possa compreender, então um atrativo para trazer quadros melhores se faz necessário.

Wilson
Wilson
6 anos atrás

O problema do uso de conscritos hoje em dia é uma falácia. Cada vez mais jovens querem entrar nas forças armadas e são barrados porque simplesmente não tem vaga para todos. Sim, o sistema já esta na hora de ser repensado mas o problema das forças armadas não é o fato de termos conscritos.

Bueno
Bueno
6 anos atrás

Uma nação se sustenta com poder cientifico /tecnológico, financeiro , politico e militar

Delfim
Delfim
6 anos atrás

Castello Branco talvez tenha sido o mais inteligente dos presidentes-generais.
Se dependesse dele o regime militar não duraria tanto.

Fabiano WVJ
Fabiano WVJ
6 anos atrás

Em uma guerra, suponho que a tática mais adequada é a de quem se propõe a ir cumpri-la. A melhor forma de executar uma missão é melhor vista por quem está lá na ponta da lança. É assim??

Agnelo Moreira
Agnelo Moreira
Reply to  Fabiano WVJ
6 anos atrás

Existe tática em diversos escalões.
Do Pel Fuz, bem na na linha, até acima das Divisões.
Cada escalão faz uma análise de diversos fatores e emprega a doutrina pra cumprir a missão.
De acordo com o nível, aspectos são considerados de forma diferente.
Sds

Adriano Luchiari
Adriano Luchiari
6 anos atrás

Exato, sua intenção era barrar os nacionalistas reformistas, representados pelo Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) e o projeto de Reformas de Base do governo João Goulart e todas as organizações consideradas pelo governo militar como nocivas à pátria e à segurança nacional, além de impedir que se instaurasse um regime comunista no Brasil. Após o que, convocaria eleições gerais diretas, devolvendo o poder aos civis. Porém a caserna se dividiu em dois grupos. Os castelistas defendiam a posição de Castello Branco, de “arrumar a casa” e voltar para o quartel o mais rápido possível. Já os costistas, alinhados com general Costa… Read more »

Delfim
Delfim
6 anos atrás

Costa e Silva tinha duplo rancor com CB, pois além de ser de ser “linha-dura” era o General mais antigo, e por isso se julgava no direito de ser Presidente, o que de fato aconteceu, por sua imposição pessoal e com o apoio da “linha-dura”.
.
Até hoje o acidente aéreo que vitimou CB é uma história mal-aceita.

Bravox
Bravox
6 anos atrás

Algum post sobre o rompimento das conversações entre EUA,Coreia do Norte e Coreia do Sul?
(da um bom post Galante)