Operação militar no Haiti custa R$ 1,3 bi em 10 anos

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ClippingA participação de tropas brasileiras na missão de paz do Haiti completa 10 anos neste domingo. A operação militar aumentou a importância do Brasil no cenário internacional e ajudou o Haiti em um período de inúmeras crises políticas e catástrofes naturais. Isso tudo a um custo aproximado de R$1,3 bilhão aos cofres nacionais. Contudo, após uma década no terreno e alguns revezes – sendo o principal deles um terremoto de proporções catastróficas que deixou 300 mil mortos em 2010 – o Brasil e a comunidade internacional enfrentam no país uma fase de fadiga de esforços.

Esse desgaste não é causado por ações de insurgentes, como no início do processo, mas em grande parte por questões burocráticas, políticas e culturais relacionadas ao próprio Haiti, de acordo com analistas. Ao mesmo tempo em que fornece apoio para a solução de uma crise política de grandes proporções – há cerca de dois anos o Haiti tenta sem sucesso eleger um novo Parlamento – e lida com uma epidemia de cólera, a ONU estuda maneiras de começar a se retirar do país em 2016.

Até o fim de 2013, a operação militar brasileira no país custou R$ 2,1 bilhões. Segundo o Ministério da Defesa, 35% desse valor foi reembolsado pela ONU. Ao todo 30 mil militares passaram pela missão e 22 morreram – a maioria durante o terremoto de 2010. Mas apesar das dificuldades, autoridades e especialistas avaliam que a missão tem sido positiva tanto para o Brasil quanto para o Haiti.

Em linhas gerais, o cenário de segurança no Haiti foi estabilizado. Confrontos significativos entre rebeldes e capacetes azuis não ocorrem há sete anos e as estatísticas dos crimes comuns começaram a baixar no ano passado. A estabilidade possibilitou ao Haiti realizar duas eleições presidenciais – conturbadas, porém livres – e trabalhar na reestruturação de sua força policial e também do sistema judiciário. Além disso, a presença militar abriu caminho para que ONGs internacionais oferecessem socorro a populações antes isoladas pela atuação de forças rebeldes.

“Em 2004 não se entrava em bairros como Cite Soleil e Bel Air. A parte de segurança melhorou bastante, hoje você anda a pé em lugares em que só se entrava dentro de blindados”, disse o embaixador brasileiro Igor Kipman, que acompanhou toda a missão no país como responsável pela divisão de Caribe no Itamaraty e também chefiando a embaixada brasileira no país por três anos.
Mas essa melhora não significa que o país esteja totalmente calmo. A crise política e a ausência do Estado em determinados setores vêm deflagrando desde setembro do ano passado uma série de manifestações populares que por vezes se tornam violentas. Em muitas delas, os participantes pedem a queda do atual presidente Michel Martelly.

Após sofrer muitas baixas no terremoto, a polícia já está sendo reestruturada, mas apenas em 2016 deve ter condições de assumir a segurança no país sem a ajuda de tropas da ONU. Na parte econômica, a existência da missão de paz como um todo tem injetado bilhões de dólares no Haiti. Somente após o terremoto de 2010 quase US$ 10 bilhões foram prometidos por países doadores para reconstruir a nação caribenha. Críticos disseram porém que uma parte considerável desse dinheiro não foi investida diretamente no país, mas na manutenção das estruturas de milhares de ONGs internacionais que operam no território.
Contudo, segundo Kipman, apenas a presença de militares e civis da Minustah (missão de paz no Haiti) no país – que compram produtos, alimentos, pagam aluguel e consomem serviços e entretenimento – injetou na economia cerca de US$ 8 bilhões na última década.

Na área de infra-estrutura, as três unidades de engenharia militar da Minustah – uma delas brasileira – asfaltaram grande quantidades de ruas, construíram inúmeros poços artesianos, desobstruíram canais e lançaram uma série de pontes sobre rios. Batalhões brasileiros e internacionais também realizaram ações sociais sistemáticas, que incluíram atendimento médico e odontológico, distribuição de suprimentos e de água.

Segundo o embaixador Kipman, a comunidade internacional lida hoje com um problema de “fadiga” na missão no Haiti. Parte disso está relacionado a uma herança cultural haitiana que faria certos segmentos da sociedade tenderem a rechaçar ações internacionais no país. “Essa foi uma marca que ficou na cultura do país desde a escravatura”, afirmou o embaixador.
Com uma revolução escrava de grandes proporções, o Haiti foi a primeira nação americana a conquistar a independência do colonizador em 1804.

Os fatores político e burocrático também têm sido entraves – que dificultaram até iniciativas diplomáticas brasileiras. Em 2010, por exemplo, o presidente Lula prometeu a construção no país de quatro unidades médicas no modelo brasileiro UPA (Unidade de Pronto Atendimento). A primeira delas deveria ter ficado pronta no mesmo ano, mas só saiu do papel em 2014. O governo brasileiro disse que uma verba de US$ 70 milhões (R$ 157 milhões) está disponível. Mas o governo haitiano teria tido dificuldade para encontrar locais para a construção das unidades, o que atrasou o processo.

Outro grande projeto que tramita sem data para conclusão é a construção de uma usina hidrelétrica na região central do país, que ajudaria a suprir o déficit de energia do Haiti e impulsionaria o desenvolvimento de indústrias. O projeto da usina foi elaborado pelo Exército brasileiro a um custo de R$ 4 milhões. Mas nunca se tornou realidade devido entre outros fatores à falta de financiamento por parte de outras nações doadoras e devido a uma polêmica envolvendo uma comunidade nativa que teria que ser removida do local.

A participação brasileira na Minustah não trouxe mudanças apenas para o Haiti, mas também para o Brasil. As mais significativas sem dúvida foram o surgimento de uma onda de imigrantes haitianos que passaram a entrar em território nacional desde 2010, o aumento do prestígio internacional do país e as melhorias relacionadas à capacitação das tropas brasileiras que passaram por Porto Príncipe nos últimos dez anos. As remessas internacionais de dinheiro feitas ao Haiti por imigrantes vivendo no exterior sempre foram parte importante da economia haitiana. Historicamente os principais destinos da diáspora haitiana eram os Estados Unidos e a vizinha República Dominicana. Mas desde o grande terremoto de 2010 as condições no país se degradaram e o Brasil passou a figurar como país de destino.

Naquele ano, apenas 39 haitianos entraram legalmente no Brasil. Mas desde então o número começou a subir rapidamente: 988 em 2011; 2.235 em 2012; 10.156 em 2013 e 4.294 até abril deste ano. Segundo a Polícia Federal, o número de legalizados passa hoje de 17.700. De acordo com analistas, o contato com as tropas brasileiras e um discurso amigável de Brasília após o terremoto foram alguns dos principais fatores de atração.

Segundo o Capitão de Mar e Guerra Fernando José Afonso Ferreira de Sousa, do Ministério da Defesa, além do ganho de influência no cenário internacional, em termos militares e de proteção da soberania a participação em uma operação internacional de paz tem um efeito de dissuasão contra outras nações em cenário regional. Além disso, segundo ele, a Minustah colaborou para uma melhoria na capacitação das Forças Armadas brasileiras, especialmente para participação em missões de paz.

De acordo com ele, a qualidade do militar brasileiro nesse tipo específico de missão já pode ser comparada à de combatentes americanos ou europeus. “O Brasil alcançou um patamar de desenvolvimento muito grande e se aproximou sobremaneira de países da Otan na questão de missões de paz”. Segundo Sousa, para atender as exigências da ONU em termos de qualidade de equipamentos militares, o país também promoveu uma melhoria nos equipamentos usados por suas forças armadas, especialmente nas unidades que passaram pelo Haiti.

E de acordo com ele, a missão em situação real ajuda os militares brasileiros não só em operações de paz. A missão forneceu experiência para o uso adequado (e moderado) da força em cenário urbano e ensinou o militar a respeitar a cultura do país estrangeiro – “o que se refletiu também em respeito à nossa própria cultura”, disse o comandante. O embaixador Kipman afirmou ainda que as táticas desenvolvidas para pacificar Porto Príncipe colaboraram para o desenvolvimento do modelo de UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), usadas para reduzir a violência nas favelas do Rio de Janeiro.

“Para o Brasil foi uma aprendizagem extraordinária, não só profissional mas do ponto de vista humano. Do soldado ao general houve uma abertura de horizontes e eles voltaram com outra visão de Brasil, voltaram reconciliados com o país”, disse Kipman.
De acordo com ele, esse ganho de experiência também aconteceu na área civil, com diplomatas, ONGs e órgãos como a Embrapa ganhando experiência excepcional que pode ser usada no Brasil.

“Considero que a missão tem sido um grande sucesso”, disse Kipman.

FONTE: BBC Brasil

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Corsario137
Corsario137
10 anos atrás

Pois é, isso me lembrou um debate que houve outro dia no Naval sobre a necessidade de se comprar um Mistral sob a justificativa, entre outras, de “economizar” no transporte de tropas e material para o Haiti.

Em 10 anos gastamos no Haiti + ou – o que gastaríamos só para adquirir tal meio.

Termino por aqui já que isso é assunto pro Naval.

aldoghisolfi
aldoghisolfi
10 anos atrás

Víxe!… e mais uma vez pergunto: quando volta a tropa?

SMJ, penso que é muito dinheiro mal aplicado…

Rafael Oliveira
Rafael Oliveira
10 anos atrás

Eu até sou a favor do Brasil enviar tropas em missões da ONU, afinal, treino é treino e jogo é jogo, e essa é uma forma de nossos militares atuarem de verdade.

Mas sou contra ficar fazendo papel de polícia e de construtora em outros países. Esse dinheiro seria melhor gasto em equipamentos para as FAs.