Por que China e não Cuba?
Adriana Carranca
Deixemos de lado a retórica antiamericana dos governos de esquerda na América Latina – ou nem tão de esquerda assim, como disse em entrevista recente Jon Lee Anderson, biógrafo de Che Guevara, que os classificou como “um bando de superficiais” – e o discurso da presidente Dilma Rousseff em repúdio ao embargo econômico americano contra Cuba, ontem, durante cerimônia de inauguração da primeira etapa do Porto de Mariel, financiado pelo Brasil. Afinal, por que os Estados Unidos mantêm o embargo a Cuba ao mesmo tempo em que sustentam como parceiro comercial a China? Por que superaram as desavenças ideológicas com o governo chinês e não o cubano? Vejamos.
Cuba é um Estado autoritário no qual o Partido Comunista (PC) é constitucionalmente o único partido legal e “a força superior de liderança da sociedade e do Estado”. Bem, a República do Povo da China é um Estado autoritário no qual o Partido Comunista chinês (PCC) é constitucionalmente a autoridade suprema. Cuba é liderada por Raul Castro, primeiro secretário do PC e comandante chefe das forças de segurança. Na China, Xi Jinping é o secretário geral do PCC e presidente da Comissão Central Militar.
As descrições acima estão no mesmo relatório do Departamento de Estado dos EUA, publicado no ano passado, sobre a situação dos direitos humanos no mundo e constam no primeiro parágrafo das seções sobre Cuba e China.
Tortura, trabalho forçado, prisões psiquiátricas e a doação compulsória de órgãos
Em Cuba presos são mantidos em prisões lotadas, escuras e abafadas, com instalações sanitárias ou serviços médicos “inadequados”, onde dissidentes, ativistas pró-democracia e presos em geral dormem no chão de concreto ou em colchões “finos, infestados de insetos e vermes”. São sujeitos à intimidação e, às vezes, a agressões físicas. Na China, há tudo isso e “numerosos ex-prisioneiros relataram ter sido surrados, sujeitos a choques elétricos, forçados a sentar-se sobre fezes, privados de sono, entre outras formas de abusos físicos e psicológicos”. Confissões são arrancadas por tortura de presos amarrados de cabeça para baixo por dias, continua o relatório sobre China. Condenados são enviados a campos de trabalho forçado e há “relatos generalizados de presos políticos mantidos em instalações de saúde mental e involuntariamente submetidos a tratamento psiquiátrico”.
O Ministério da Segurança Nacional chinês administra diretamente 24 dessas instalações, chamadas de ankang, onde mais de 40 mil pessoas foram internadas desde 1998, entre elas, ativistas pró-democracia, religiosos, integrantes do banido Partido da Democracia, e cidadãos comuns que ousaram registrar petições contra o governo. Seus parentes recebem tratamento “particularmente duro”, revela o relatório dos EUA. O Ministério da Saúde de Pequim prometera acabar até 2017 com a prática, admitida publicamente pelas autoridades, de “tirar órgãos humanos de condenados à morte para transplante”, o que significa que o ritual macabro continua. Está tudo no relatório dos EUA.
De fato, a situação dos direitos humanos não é boa em Cuba, mas a China comunista parece realmente superar a ilha de Fidel nesse quesito. E a Casa Branca sabe bem disso.
Em Cuba, há 57,3 mil presos, alguns mantidos em isolamento, outros em campos de trabalho forçado e há adolescentes em instalações de segurança máxima. Outros três mil estão presos sem julgamento por “periculosidade potencial” (já imaginou se isso pega no Brasil?). Já a China não divulga o número de presos no país. Mas o relatório do Departamento de Estado americano cita um documento do Ministério da Justiça que revela haver 1,6 milhão de presos em 681 centros de detenção chineses. Segundo o Centro Internacional de Estudos Penitenciários, ONG britânica ligada à Universidade de Essex, outros 650 mil presos aguardavam sentença e entre 100 mil e 260 mil estavam detidos sem julgamento em prisões na China, onde “crianças são mantidas com presos adultos e obrigadas a trabalhar”.
Em Cuba, não houve em 2012, ano em que os dados do relatório foram levantados, registros “de que o governo ou seus agentes cometeram execuções arbitrárias” ou “de desaparecimentos políticos”, embora tenham havido no passado. Na China, “as forças de segurança cometeram execuções arbitrárias” às centenas e são frequentes os assassinatos sob a custódia do Estado, o que naquele ano incluiu um menino muçulmano de 11 anos, preso por frequentar uma escola islâmica e espancado até a morte. Ativistas, religiosos, dissidentes e opositores desapareceram sem deixar rastros, diz o relatório, muitas vezes levados sob a acusação de revelar segredos de Estado, embora a definição seja pobre.
Em Cuba e na China toda a mídia é controlada pelo governo e usada como propaganda oficial, não há imprensa livre e a Internet é censurada. A Cuba dos Castro tem “pouca tolerância a críticas” e faz uso frequente de prisões de curto prazo (horas ou dias) para evitar protestos e o debate público é “limitado”. Na China, críticas aos líderes do governo são proibidas por lei e a distribuição de propaganda antigoverno prevê penas de 3 meses a 15 anos de prisão. O relatório aponta ainda, sobre a China: a intervenção na vida privada, como o ainda forte controle de natalidade, que envolve abortos forçados; a ausência de direitos trabalhistas e a corrupção endêmica.
Ao todo, os abusos e crimes cometidos pelo governo comunista chinês ocupam 159 páginas do relatório do Departamento de Estado americano; os do regime dos Castro ocupam 29 páginas.
O maior credor dos EUA
Os cubanos não vivem a democracia desejada pelos americanos; tampouco os chineses. Cuba mantém relações próximas com arqui-inimigos dos EUA, como Venezuela; a China, com Coreia do Norte, Irã, Síria.
Mas, há uma grande diferença entre eles. Enquanto o embargo a Cuba persiste, a China se tornou o maior credor da dívida externa americana. Dos cerca de US$ 14 trilhões da dívida americana, algo como US$ 5 trilhões são devidos a investidores estrangeiros, o maior aporte à China, com US$ 1,16 trilhão.
Cuba, é verdade, não fez as reformas de mercado que fez a China. Os primeiros passos, ainda tímidos, nesse sentido foram dados muito recentemente após a aposentadoria de Fidel Castro. O irmão e sucessor, Raúl Castro, adotou o que chama de “atualização do modelo econômico”.
Na China, as reformas começaram logo após a morte de Mao Tse Tung em 1976. Nos início dos anos 1980, o governo acabou com as cooperativas agrícolas e permitiu negócios privados, abrindo o mercado para estrangeiros nas décadas seguintes. Mas a reforma política jamais acompanhou a econômica. O Partido Comunista da China continua tão poderoso, autoritário e violador quanto antes. Combate brutalmente qualquer sinal de oposição e manda dissidentes para campos de trabalho forçado, interna-os em prisões psiquiátricas ou simplesmente os executa. A China é um dos cinco países com poder de veto no Conselho de Segurança da ONU, poder este que usa para bloquear sanções contra os governos mais corruptos, autoritários e sanguinários o mundo. Entrou para a Organização Mundial de Comércio, mas mantém relações comerciais tensas com um enorme superávit comercial, desrespeito a patentes e a pirataria de mercadorias.
É como diz um amigo, empresário paulistano: “A China continua tão comunista e autoritária quanto antes. E nada me tira da cabeça que está usando as armas do capitalismo para matar o próprio capitalismo.”
FONTE: O Estado de S. Paulo
Primeiro
A China não está a apenas alguns quilômetros do EUA.
A China não tentou instalar mísseis nucleares a apenas alguns quilômetros dos EUA.
Segundo
O embargo contra Cuba é só dos EUA e não do resto do Mundo. Assim o fracasso econômico cubano é devido só e somente a eles próprios. Por sinal, americanos deixam bastante dinheiro em Cuba, pois viajam ao Canadá ou México para em seguida ir à Cuba.
Terceiro
Quanto à China ser o principal credor americano: azar o deles.
Para encerrar: o problema é a postura, não dos EUA em relação aos dois países, mas destes dois em relação aos EUA.
Alimentar cobras sempre resultou em picadas, cedo ou tarde.
O mundo capitalista fez um desfavor ao seu modo de vida ao iniciar negociações comerciais “irrestritas” com a China e como disse em um post anterior, os chineses são os únicos que parecem ter um plano para saltar desse “bonde de interdependência”, desse Status Quo que está se mostrando cada vez mais vantajoso para a China.
Em algumas décadas, eles não precisarão mais “respeitar” algum fiel da balança nessa relação, pois eles serão/controlarão a balança.
O erro dos americanos com relação a Cuba, foi deixar que a ilha/regime se transformasse em um mártire de um modelo revolucionário, a CIA já era para ter dado cabo dos assassinos Castro desde a queda do muro, no momento em que a Ex-URSS cortou a mesada a ilha.
– Certa vez estava andando de skate em SP e tinha um grafite muito bem feito em um dos half: “A Ilha não afunda, ela navega. A Ilha não se rende”. Eu tinha 16 anos e já achava aquilo ridículo, não tinha nada haver com o mundo do esporte, com o mundo do skate, um total contra senso, o grafite ali e todos nós com roupas estilo grunge e equipamentos importado dos EEUU. – RIDÍCULO
Sds.
De toda a leitura, continua o pensamento no sentido de que como é possível alguém continuar querendo, ano após ano, ficar justificando Cuba… pergunto porque a população de Cuba não cresce? Porque esta angústia de exportar seus ‘médicos’? Cidades sujas, deterioradas, povo miserável, mal vestido, que só sabe fumar charutos e cantar velhas dor-de-cotovelo, carros dignos de um museu e um ‘Comandante’ assassino que tem mais dinheiro do que a rainha Elizabeth!
Marcos disse tudo lá em cima.
“A China continua tão comunista e autoritária quanto antes. E nada me tira da cabeça que está usando as armas do capitalismo para matar o próprio capitalismo.”
Fecha a conta e pasa a régua!
errata:
…e passa a régua!
A china não se sustentará comunista por muito tempo. A hora que as benesses do capitalismo começarem a vicejar no seio da população haverá um processo de mutação, pacífico ou violento, mas haverá.
Os castro são um câncer para Cuba. Mas o fim virá, e Cuba será uma colônia de férias dos EUA como ja foi em 1950. A apatia do povo Cubano é o que querem implantar aqui.
Por fim, porque esta mulherzinha que esta na presidência não foi minimamente coerente e, ao criticar o embargo, também não falou das violações de direitos humanos do “cumpanheiro”. De novo, dois pesos e duas medidas. A incoerência é a maior marca destes sem honra. Por isso o PSTU e o PSOL eu ainda respeito. Pior, somos todos medidos no exterior pelo que esta gente do GF (MAG dirigindo) fala. Podiam fazer uma certa antes de sairem do poder. Não peço muito, apenas uma.
Colombelli,
concordaria 100% com você, a não ser por – “A china não se sustentará comunista por muito tempo”. Infelizmente eu não acredito nisso.
O PCC ainda tem muito lastro para jogar de um lado para o outro equilibrando as coisas, e esse barco é MUUUIIITO grande… vai levar umas boas 4 ou 5 décadas para estarmos perto dessa situação.
Sem falar que este cenário só aconteceria SE as coisas tivessem indo de mal a pior. Mas na verdade a situação é o contrário, no geral eles estão muito bem obrigado.
Sds.
Cara Adriana Carranca:
Não entendi onde você quis chegar com seu texto.
Você condena os EUA porque são malvados com Cuba? É isso? Ou condena os EUA por conta de que fazem negócios com a China?
Se a questão é a primeira pergunta, respondo o seguinte: não estou nem ai. Por mim os EUA poderiam (deveriam) invadir aquilo ali e instalar uma democracia naquela ditadura caribenha, onde o povo é explorado, inclusive por vagabundos de outros países.
Se a questão é a segunda pergunta, respondo dizendo que antes de condenar os EUA, você deveria começar dando o exemplo, não comprando nenhum produto fabricado na China.
Chega uma hora que vai enchendo o saco essa idolatria por Cuba. Vão para lá!!!!
Eu penso que se os EUA suprimissem o embargo econômico, essa seria a maneira mais rápida de derrubar a Castrocracia de Cuba, com a vantagem de não ter que disparar nenhum tiro. A proximidade com o gigante EUA faria com que uma abertura desse tipo se tornasse uma verdadeira revolução interna através da “invasão comercial” que ocorreria.
Algo como o que acabou ocorrendo nos países comunistas próximos da Europa Ocidental e que acabou varrendo o comunismo nos anos 80-90.
Mas…isso é só a minha opinião, parece que os estadounidenses não pensam assim, ainda tem esperança de estrangular Cuba até que o regime caia sobre seu próprio peso. É uma possibilidade, sim, mas as últimas décadas indicam que não está dando certo. Mas os gênios da política internacional são eles e não eu, então eles devem estar certos e eu errado.
Oganza, o paradoxo chinês é que quanto melhor forem as coisas pra China, pior pro PCC.
Quanto mais riqueza acumulada na China, maior será a tentação do povo. Como diz um dos personagens do filme Circulo de Fogo, não há disciplina que supere a ganância, a cobiça e o individualismo humanos. Cedo ou tarde, formar-se-á uma elite industrial e econômica, que irá enxergar um mercado interno potencial de 14, bilhão, e a única coisa entre eles e este mercado será o partido, que será varrido do mapa em um piscar de olhos. Será como o Muro de Berlim. Esta é a natureza humana. O comunismo contraria a natureza humana, por isso fracassou e fracassará sempre.
Eu acho que não vai vinte anos isso. Da mesma forma, o próprio governo chinês irá enxergar que a pretensão de ser potência global a nível de EUA nunca será conseguida com um regime político fajuto, irracional e fracassado.
O dia que a China for capitalista dentro e fora, ai sim teremos de temer seu poder.
Jackal, concordo, seria a melhor forma. Eu acho inclusive que os EUA deveriam lançar Cuba e uma orgia autofágica de capitalismo para servir de exemplo para que ninguem nunca mais pense, sequer pense, nesta asneira de comunismo/socialismo na América. Com todos os problemas do capitalismo, o povo cubano sofreria bem menos. O pior capitalismo é melhor que o melhor comunismo/socialismo. Os EUA não fazem isso porque Cuba é insignificante, é um nada, exceto para um certo governo de um certo pais chefiado ( ainda) por um apedeuta ganancioso e quadrilheiro.
Marcos, eu seria voluntário para uma invasão a Cuba pelos EUA e iria reto atras dos Castro com as imagens de Mussolini pendurado de cabeça pra baixo na mente. Ia ser um dia de expiação e regozijo.
Caro Colombelli,
Concordo em grande parte.
Cuba creio que ainda veremos muitas coisas.
China idem porém, com mais tempero.
Quanto aos Partidões, o melhor inimigo é o que podemos ver.
O oculto dá mais trabalho.
Srs
A China era uma ditadura quando império e continua a ser com o PCC no comando, tendo havido apenas um simulacro de democracia no intervalo entre as duas estruturas de poder. Falta experiência de Democracia aos chineses.
Quanto a Cuba, é provável que, finda a dinastia Castro, acabe voltando a ser um estado associado aos EUA (a população cubana nos EUA, que é a maior fonte de dólares de Cuba, parece já ser maior do que a que existe na ilha).
Se isto acontecer nos próximos anos e a América do Sul seguir o atual caminho teremos uma situação extremamente irônica, com os países sul americanos (Brasil incluso) mergulhados em regimes socialistas modelo Fidel Castro e Cuba plenamente capitalista estilo Tio Sam.
Sds
A sutileza deste texto vai além da visão simplista que se defende Cuba e ataca China.
Destaco três pontos:
1. Não existem motivos coerentes para os EUA manterem este embargo. O medo do comunismo dominar o mundo caiu com o murro de Berlim. Este era o receio único dos norte-americanos: ter uma ponta de divulgação do modelo nas Américas. O modelo morreu, mas o embargo continua.
2. O discurso norte-americano é moldado pelos interesses econômicos. Até aí, nenhuma novidade. Mas é flagrante a realidade que só se critica o mais fraco.
3. Não passará uma década e o regime de Cuba será diluído por completo, sem derramamento de sangue.
Teremos dezenas e dezenas de anos para a China tentar uma experiência democrática, mas não sem antes iniciar-se uma longa e sangrenta guerra civil – ou pior – na tentativa de manter o regime, começar uma guerra com o Japão, que terá consequências mundiais imprevisíveis.
No dia em que houver uma guerra civil na China o resto do mundo será arrastado para ela, em um efeito dominó! Estamos falando de uma potencia militar, econômica e nuclear. Na China o comunismo socialista morreu, dando lugar ao comunismo capitalista, coisas do século XXI!
Comunismo capitalista: he, he, he!!!!
“Não importa a cor do gato, desde que ele coma ratos”.
A China já existia antes do comunismo e continuará existindo depois. Podem ter treinado uns terroristas aqui e ali, mas as fidelidades partidárias nunca foram o interesse chinês, tanto que quando a coisa pega eles não tem muito problema em se virarem contra seus “camaradas”.
Isso é tão claro que se tem uma coisa que assusta o pessoal do PCC é não parecer patriótico o suficiente frente ao seu povo.
Fizeram experiências sociais em certos distritos e os resultados foram promissores. O resultado é que continuam trabalhando com seu capitalismo de estado enquanto esse for útil. No final das contas o que manda é o pragmatismo.