Espionagem, a batalha na ONU
Show de hipocrisia ou pressão da opinião pública? Depois de uma batalha diplomática nos bastidores, os EUA evitaram o isolamento e acompanharam o voto dos outros países. O Reino Unido emitiu nota dizendo-se satisfeito com a proposta, só lamentou o pouco tempo para discussões. Mais 33 nações assinaram junto com o Brasil e a Alemanha a resolução da ONU que promove a privacidade on-line à categoria de direito humano universal. O texto aprovado esta semana por unanimidade certamente será referendado pelo plenário da Assembleia Geral da ONU ainda este mês. Ou, seja, Dilma e Merkel saíram bem na foto, com o apoio geral e irrestrito à indignação das duas contra a espionagem em massa de americanos com potências aliadas. Mas algum país vai cancelar programas de informação ou estão todos só tentando dar um brilho na imagem?
“Não se trata de hipocrisia. A comunidade internacional acordou para um problema real,” diz o embaixador brasileiro na ONU, Antônio Patriota, recém estreando nas novas funções após a tumultuada saída do comando do Ministério das Relações Exteriores.
“O nervosismo no ar” das Nações Unidas é, para o embaixador brasileiro, prova de que não é inócua a resolução. Na verdade, diz uma fonte, o jogo foi pesado para evitar uma condenação direta dos EUA e do govemo Obama, já com a reputação arruinada pelo vazamento constante dos abusos cometidos pela Agência de Segurança Nacional em nome da necessidade de proteção contra o terrorismo.
Nas reuniões com brasileiros e alemães para adocicar o texto da resolução, diplomatas do Reino Unido e Austrália ficaram na linha de frente das negociações, mas os EUA, silenciosamente, nos bastidores, sinalizavam as mudanças consideradas imprescindíveis pelos chefes da segurança — segundo a “Foreign Affairs” foi editado um livreto, “Direito à privacidade na era digital – as linhas vermelhas americanas” para orientar os diplomatas.
O embaixador brasileiro minimiza as pressões. “Nós realizamos consultas abertas, a resolução manteve o principal, a ideia de que sem respeito à privacidade não há liberdade de opinião e de expressão” diz, citando o apoio unânime das organizações de direitos humanos, expresso em carta aberta aos embaixadores das Nações Unidas. “Depois da resolução, os EUA vão passar a tratar a questão da privacidade com mais seriedade” diz o embaixador.
Pode ser, diplomacia é lenta, mas vale a pena. O acordo com o Irã e a iminente destruição das armas químicas da Síria provam de novo que negociações entre países são melhores do que intervenções militares de superpotências, incorporando o espírito de polícia do mundo. As duas reviravoltas na diplomacia mundial também evidenciam, mais uma vez, que países têm interesses e não amigos: o aliado preferencial, Israel, foi deixado sozinho com seus medos e sua retórica de guerra quando os EUA perceberam uma oportunidade de ganho político no Oriente Médio e iniciaram uma negociação em segredo com o arqui-inimigo Irã.
Por que no caso da espionagem seria diferente? O apoio à resolução na ONU e a condenação internacional ao programa de espionagem não levaram Obama a pedir desculpas pelos abusos nem uma única vez. Ele reconheceu que exageros podem ter sido cometidos, mas o orçamento da Agência de Segurança Nacional foi aprovado sem cortes. Enquanto lançava com o Brasil a resolução condenando a espionagem, a Alemanha negociava sua participação no bloco dos cinco olhos — EUA, Reino Unido, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Ou seja, também quer fazer parte desse novo grupo de poder formado pelos aliados prioritários, entre os quais são compartilhadas informações secretas. O ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, por exemplo, continua com o poder de determinar sozinho quem deve ter comunicações interceptadas. Nas empresas ao redor do mundo, as brigadas contra ataques digitais foram reforçadas e estão em alerta contra a espionagem comercial capitaneada por estados — todos lembramos que a NSA também interceptou as comunicações da Petrobras.
“É pouco provável que a resolução tenha real impacto nas atividades da NSA, exceto nas margens” disse o professor da Lews & Clarke Law School, Tung Yin, ao jornal “Guardian”
O Brasil fez muito barulho para nada? Não, a defesa das liberdades civis sempre será bom combate. Mas, sem nenhum cinismo, soluções de mercado também têm valor, dizem especialistas: criar fora dos EUA — na Alemanha, por exemplo — um servidor com o compromisso público de não abrir dados dos usuários para nenhum governo pode ter um enorme impacto na vida real. Nos EUA, Snowden usava um servidor assim, mas a empresa fechou para não entregar informações exigidas pelos serviços secretos americanos. No mais, Patriota tem razão: a resolução brasileira ajuda a mudar o debate sobre o desrespeito à privacidade.
FONTE: O Globo, via Resenha do Exército
Enfim – Faça o que eu digo, não faça o que eu faço…
… até porque, você não tem copetência para tal.
Sds.