Uma visão política e econômica dos protestos
ROBERTO MACEDO *
Na política, há no Brasil excessiva concentração de poder no governo federal. É profundamente enraizada e remonta ao período imperial. Conforme Roberto Romano resumiu neste espaço no dia 23 de junho último “(…) a pessoa presidencial (…) doméstica, pela propaganda e controle dos recursos públicos, a soberania popular, e distorce a representação do Parlamento”.
Esse quadro não muda, mas o perfil dos eleitores mudou. E muito. Em 1950 o Brasil tinha 52 milhões de habitantes, 64% nas áreas rurais. A miséria aí se concentrava, quase não votava, e a classe média tradicional, influente politicamente, era cortejada pelos políticos. Em particular, eles lhe garantiam boa educação pública nas cidades, nos primeiros quatro anos de escola. Nos quatro seguintes e no ensino médio, de forma bem mais limitada, os colégios públicos destacavam-se pela qualidade.
O limitadíssimo ensino superior era essencialmente público. Pouco se falava dos problemas sociais. A segurança estava muitíssimo distante da gravidade atual e a mobilidade urbana não era, como hoje, prejudicada pelo crescimento populacional e pelo trânsito-congestionado.
Já no censo de 1991 a população passou a 147 milhões, quase 100 milhões (!) a mais que em 1950, e 76% urbana. A pobreza, sempre descuidada, já marcava a paisagem das grandes cidades. Com direito de voto ampliado, os eleitores mais pobres passaram a ter enorme força política. No processo, a classe média tradicional abandonou a educação básica pública, que caiu muito em qualidade ao ser ampliada para a clientela em expansão. A superior expandiu-se mais na esfera privada, e aí também vieram as mensalidades. Vieram igualmente a alta criminalidade e a lenta mobilidade urbana, entre outros males endêmicos.
Foi nesse contexto que emergiram os governos federais petistas, obcecados pela manutenção do poder a qualquer custo. Portando a bandeira da inclusão social, mas focados nas umas, passaram a um vale-tudo programático para agradar à nova e enorme massa de eleitores, sem atentar para o que se passava com a classe média tradicional. Com frágil representação política, ela também viu seus valores, como a ojeriza à corrupção, atropelados no processo. Não sem razão, são seus filhos que predominam nas ruas. Não reclamam do pão para os pobres, mas do circo da Copa, que para estes só está na TV, na qual se percebe que são raros nos estádios.
Passando à economia e aos números, a concentração de poder na esfera federal é evidente nos dados de receita tributária disponível por nível de governo, que configuram o chamado pacto federativo. Mas não houve pacto, foi imposição da União. Segundo números de 2011, ela ficou com 57,1% do to-tal, 33% mais que a soma das partes dos Estados, com 24,6%, e dos municípios, com 18,3%. Isso impede que estes dois últimos entes, que estão na ponta do atendimento a carências de educação, saúde, segurança e mobilidade urbana, possam dar um atendimento não tão ruim como o atual. Eles também têm limites para endividamento. Seu maior credor é a própria União, que se endivida sem limites, e lhes cobra encargos que não paga na sua própria dívida.
Nos gastos, o governo federal é pautado pelo populismo, numa implacável caça aos votos. Isso fica claro pela evolução dos gastos da União nas gestões petistas. Conforme meu último artigo, desde o fim do governo FHC, em 2002, e até 2012 o gasto não financeiro federal teve aumento de 2,5% do produto interno bruto (PIB). É um dinheirão. Com base no PIB de 2012, esse acréscimo foi de R$ 110 bilhões.
Sustentado com maior carga tributária, foi impulsionado principalmente por mais 1,2% do PIB nos gastos previdenciários do INSS e 1,1% do PIB noutros gastos sociais, como seguro-desemprego, abono salarial, Bolsa Família e benefícios devidos a idosos e inválidos. Com isso, 92% do aumento dos gastos não financeiros de Lula e Dilma foi desse tipo, impulsionado principalmente pelas elevações do salário mínimo, que guardam relação com eles. Como resultado, os investimentos, que ampliariam a oferta e a qualidade de serviços públicos, foram prejudicados. No mesmo período, seu acréscimo foi de apenas 0,1% do PIB.
E já existe de fato um 40.º ministério, que cuida do marketing político federal, sempre a anunciar benesses e lhes dando marcas como a produtos das prateleiras de um supermercado político. É bolsa disto e daquilo, casas que são vidas a melhorar com eletrodomésticos a preços subsidiados, e por aí afora.
Mas um governo que se disponha efetivamente a resolver problemas não se pode limitar às benesses. Há, por exemplo, a necessidade de redistribuir receita para Estados e municípios, de reduzir gastos de consumo, de investir mais, de apertar as regras de aposentadoria para acomodar o aumento do número de idosos e de mudar a regra de reajuste do salário mínimo para reduzir o desequilíbrio de gastos acima apontado. Ora, isso exigiria políticos estadistas e inarqueteiros realmente talentosos, capazes também de cativar uma clientela para os sacrifícios necessários, tal como os médicos convencem doentes a tomar remédios amargos e a passar por cirurgias dolorosas e arriscadas.
O Brasil está doente política e economicamente. Parafraseando Castro Alves, e com vozes não d”África, mas daqui mesmo, deste país, é o caso de perguntar por essas personalidades que ainda não deram as caras: “Meus”! Ó “meus”! Onde estão, que não respondem? Em que mundo, em que estrela se escondem?
Hoje, no céu político, a estrela do PT é (de)cadente. Se tem líderes capazes de efetivamente resolver os graves problemas do País, que apareçam, pois ela e suas políticas populistas não servem mais como esconderijo. A classe realmente média descobriu isso, saiu pelas ruas e pôs a boca no trombone.
O País está doente nessas duas áreas e o PT se revela incapaz de tratá-lo.
Economista (UFMG, USP E HARVARD), professor associado à FAAP. É consultor econômico de ensino superior.
FONTE: O Estado de S. Paulo
Brilhante texto!!!
Resume de forma coerente e apartidária a verdade nua e crua dos propósitos PTistas:
Se perpetuarem no poder a qualquer custo, aliás, as nossas custas o POVO BRASILEIRO!!!
Acabou PT, vocês não se elegem mais nem para síndico de prédio!!!
O GIGANTE ACORDOU!!!
O artigo é irretocável em suas premissas.
Por essas e outras que sempre disse aqui e alhures que a primeira reforma a ser feito, a que é pressuposto de todas as outras, é a do Pacto Federativo.
Precisamos diminuir urgentemente os poderes e atribuições da União, passando-os para Estados e Municípios.
Porque?
Porque NINGUÉM fiscaliza a União Federal. Essa é a verdade. Estados e Municípios podem ser pressionados pela população, mas a Federação NÃO. A população pode acampar na frente da casa do prefeito ou do governador. Mas Brasília fica muito longe da casa da esmagadora maioria dos brasileiros.
A União Federal deveria cuidar de pouco mais que a Defesa Nacional. Deveria receber tributos para pouco mais do que isso. Todo o resto deveria ser atribuição dos demais entes federativos.
Não se governa 8,5 milhões de km2 e 200 milhões de almas de um único lugar no Planalto Central. É técnica e humanamente impossível que a União Federal conheça a realidade dos 27 estados e 5.570 municípios.
A União Federal tem que ser reduzida ao estritamente necessário.
Concordo plenamente Vader.
Se faz necessário a descentralização do poder Federal e transferi-lo para os Estados e Municípios.
Assessorei há quase uma década, um certo político que propunha o IUT – IMPOSTO ÚNICO SOBRE TRANSAÇÕES, o famoso IMPOSTO ÚNICO, que por motivos alheios e escusos, foi criada a CPMF ou IOF (não me recordo de pronto), com a desculpa de testar a forma de arrecadação e seus reflexos na economia.
Um dos pontos fortes da proposta do imposto único, era a distribuição diária para municípios (50%), governos estaduais (30%) e GF os 20% restantes, para no caso do GF, investir e manter as Forças Armadas, algumas outras despesas de âmbito federal, investimentos e verbas emergências, já os municípios com maior quinhão na distribuição, seriam responsáveis por maiores investimentos no município, como saúde, educação, transporte e todas as demais despesas e investimentos que um município necessita, já os governos estaduais, investiriam e auxiliariam os municípios com menos arrecadação, uma vez que a distribuição seria regionalizada, ou seja, o imposto gerado no município de São Paulo, voltaria para o mesmo, nessas proporções e assim por diante, ou seja, os impostos seriam redistribuídos a partir dos municípios.
Com certeza, deveríamos focar uma gestão Distrital, Municipal, Estadual e por fim Federal.
Como o Vader muito bem colocou, haveria maior participação da população, recursos e fiscalização.
A questão é polêmica uma vez que dirão que municípios pequenos terão poucos recursos, mas a contrapartida é verdadeira ao falar que possuem menos despesas e necessidades de investimentos, além do fato que as verbas destinadas aos Estados, contemplariam verbas de investimentos para esses casos e em último caso o GF também investiria com repasse de recursos para fomentar o desenvolvimento desse município.
Não é justo, cidades com São Paulo, Rio de Janeiro e outras grandes capitais, bem como grandes Estados arrecadarem altos valores em tributos (Federais) e grande parte dessas arrecadações, não retornarem para investimentos em sua origem.
É simples conta de português, SP é responsável por grande parte do PIB, ou seja, arrecada muito, e o GF simplesmente passa a régua pelo número de estados da federação (26) e retorna com 1/26 dessa arrecadação, quando retorna.
Por isso muitos estados e municípios não terem recursos em proporção para resolverem seus problemas de educação, infraestrutura, saúde, segurança, sociais e tantos outros.
Com a atual conjuntura, começam as brechas de corrupção, conchavos e desvios de dinheiro público.
Fica uma humilde proposta, o Imposto Único, cabe lembrar que a proposta era de 1%, mais nenhum outro imposto, com exceção de alguns reguladores, como exportação e importação, no mais somente algumas taxas de benfeitoria.
A propósito, em 1996 esse 1% equivalia a toda arrecadação da época, considerando que somente 30% da população na época recolhia todos os impostos, Multinacionais e S/As, assalariados e poucos outros.
A forma de arrecadação era via bancária como o IOF e CPMF, não existindo a necessidade da máquina tributária de custa 30% de toda arrecadação, ou seja, de cada R$ 1,00 arrecadado, R$ 0,30 era o custo, na época.
Enfim, já desviei demais o assunto.
Abraços
“Na política, há no Brasil excessiva concentração de poder no governo federal. É profundamente enraizada e remonta ao período imperial.”
Uma verdade incômoda e terrível.
Um dos exemplos mais nocivos é a distribuição tributária, concentrada em Brasília.
Impostos, Contribuições Sociais e Taxas são todos TRIBUTOS, cobrados por municípios, estados e união.
São tantos e tão complexos que seria necessário algumas laudas para resumir o assunto.
Contudo chamo atenção para algo simples, mas revoltante.
Apenas os Impostos entram na cesta que forma o Fundo de Participação de Estados e Distrito Federal bem como o Fundo de Participação dos Municípios.
A Constituição Federal de 1988, de acordo com o artigo 159, I, determina que percentuais da receita arrecadada com IR (Imposto Sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza) e IPI (Imposto Sobre Produtos Industrializados) serão repassados pela União aos Estados e Distrito Federal, bem como Municípios.
Art. 159. A União entregará:
I – do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados quarenta e oito por cento na seguinte forma:
a) vinte e um inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal;
b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios;
Advogado, contador, economista, administrador ou qualquer outro profissional que trabalhe com finanças (como eu) sabe que ao longo dos anos os governos federais vem aumentando sistematicamente as alíquotas de Contribuições Sociais, como PIS, PASEP, COFINS, CSLL e o malfadado ex-CPMF. Todas tinham finalidades “nobres” (detesto a hipocrisia do políticamente correto), mas que ao fim e ao cabo foram para os cofres de Brasília, sem repasses e sem carimbo.
Por outro lado, SEMPRE que o Governo Federal quer “dar” um estímulo qualquer à economia o faz reduzindo temporariamente algum IMPOSTO.
É fazer reverênca com chapéu alheio.
Se não bastesse a ‘desfederalizante’ distribuição dos tributos nacionais, Brasília ainda usa destes artifícios.
Procedimento antigo, anterior ao atual governo, mas exarcerbado na última década.
O pior é que todos os políticos, de todos os partidos, sabem muito bem do estou falando. Mas todos, de acordo com suas conveniências, guardam solene silêncio.
Os da situação estão confortáveis;
Os fisiologistas querem seu quinhão;
Os da oposição aguardam sua vez…
Esta uma das minhas bandeiras para as ruas, mas meu poder de síntese é horrível e não consigo colocar esta minha revolta em um cartaz.
Sds.,
Ivan.
Concordo integralmente com os colegas acima.
Tb gostei da sintese do Vader: “A União Federal deveria cuidar de pouco mais que a Defesa Nacional. Deveria receber tributos para pouco mais do que isso. Todo o resto deveria ser atribuição dos demais entes federativos.”
Devem fazer uns 20 anos que conclui que o Brasil nao tem solucao unica, mas serah possivel que alguns Estados as encontrem. Os Estados melhores administrados trariam uma saudavel competicao ao sistema.
Para mim, um verdadeiro federalismo, deveria ser a mais importante bandeira politica no Brasil; mas infelizmente nao eh.
[]s!
Concordo com todos. Agora, proximo passo, tornar isso realidade.