forcas militares no complexo do alemao - foto JMarques AE

vinheta-clipping-forte1Um relatório de inteligência preparado por forças de segurança do estado para explicar ações do tráfico na Maré, mesmo depois da pacificação, pode dar uma pista importante do problema que a polícia também enfrenta em outra região: os complexos da Penha e do Alemão. Em 15 páginas repletas de fotografias de traficantes armados e levantamento aéreo, o documento informa que os bandidos passaram a adotar táticas de guerrilha, com ações que combinam ocultação e extrema mobilidade de grupos que atuam em frações reduzidas e fortemente armados.

Uma demonstração de uso de tática militar aconteceu no último domingo. Em mais uma ação audaciosa, criminosos fizeram disparos contra a sede da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Vila Cruzeiro, pouco antes da largada da 4ª edição da corrida Desafio da Paz, que começou no Complexo da Penha e terminou no Alemão. A área foi pacificada em novembro de 2010. No ataque, os bandidos, que estariam armados com fuzis, vieram de fora, em número reduzido, e teriam recebido apoio logístico local. Chegaram, atiraram e foram embora. A polícia já investiga o envolvimento de bandidos que teriam saído de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense.

– É uma tática clássica de guerrilha. No caso específico, o ataque de domingo foi apenas para levar terror, desestabilizar e gerar insegurança – disse um policial envolvido nas investigações e que preferiu não ser identificado.

Segundo o documento ao qual O GLOBO teve acesso, um grupo formado por ex-militares das Forças Armadas e cooptados pelo tráfico controlaria atualmente o conjunto de favelas da Maré e estaria presente também em outras áreas pacificadas, como os morros da Mangueira (São Cristóvão) e Macacos (Vila Isabel); a favela do Jacarezinho (Méier) e a parte alta da Rocinha (São Conrado); além das comunidades do Alemão e da Penha.

No relatório, os criminosos são descritos em detalhes: “Eles recebem treinamento físico e de combate, além de usarem roupas pretas durante suas ações, uniformes considerados por eles como de guerra”. Duas dessas roupas já foram apreendidas pela 21ª DP (Bonsucesso) e em operações da PM. A radiografia sobre a dinâmica do crime nessas favelas observa que os traficantes agem usando experiência adquirida no meio militar: “o bando tem elevado nível de organização e controle de suas atividades no crime, talvez pelo fato de contar com vários ex-militares em suas fileiras”.

No caso específico da Maré, o relatório ilustra a situação com o histórico do traficante Marcelo Santos das Dores, o Menor P, acusado de ter sequestrado e torturado o jogador Bernardo, do Vasco – em depoimento à polícia o atacante negou ter sido agredido. Chefe do tráfico na região, Marcelo foi paraquedista do Exército. Na 1ª Divisão de Exército (DE), a informação é de que o traficante foi apenas recruta, deixando a corporação depois de prestar serviço militar obrigatório.

Crime age em rede, diz especialista

As favelas da Maré estão na relação de comunidades cotadas para receber um novo pacote de pacificação, no momento em que a cidade dá início a um ciclo de segurança máxima para receber grandes eventos religiosos e esportivos, que vão atrair milhares de pessoas, como a Copa das Confederações e a Jornada Mundial da Juventude, ambas este ano.

Na opinião do antropólogo Roberto Kant de Lima, professor da UFF e membro do Instituto de Estudos Comparados em Administração de Conflitos (Ineac), a polícia do Rio terá que, cada vez mais, investir em investigação e em ações de inteligência para enfrentar os bandos.

– Para que essas ações tenham eficácia, é preciso integração entre as instituições, visando à cooperação. Também seria necessário adotar procedimentos que imputassem responsabilidade pessoal aos agentes, sujeitos à fiscalização e à prestação de contas de suas atividades de investigação, e não apenas a obrigações de suas atividades cartorárias – disse Kant.

O antropólogo observa que é preciso criar mecanismos de cooperação eficientes entre as instituições:

– O problema é que as ações dessas instituições, muitas vezes, se sobrepõem, o que acarreta uma competição entre elas e, portanto, a manutenção das informações obtidas por cada uma longe do alcance das outras.

O professor da UFRJ Francisco Carlos Teixeira, autor do livro “Terrorismo na América Latina”, acredita que o combate ao narcotráfico nasceu com um grave erro de diagnóstico.

– Pensando em termos de estratégia, não conseguimos identificar corretamente o adversário, com seus pontos fracos e pontos fortes. A ocupação de território, sempre com aviso prévio, deu condições para o adversário retrair-se, reagrupar-se e voltar ao local disfarçado de cidadão. Assim, não entendemos que o “crime em rede” não precisa do território – disse o professor da UFRJ.

Texeira acha que as autoridades ainda não fizeram o dever de casa, ao desconsiderar ações básicas contra o crime organizado.

– O tráfico continua se comunicando e mantém seu fluxo financeiro, lavando dinheiro. Continua cooptando colaboradores, fazendo alistamento de novos “recrutas” e ainda recebe armas e mercadorias. É necessário cooperação estreita, permanente, entre policiais estaduais e federais e Receita Federal, Banco Central e Inteligência Militar. Se essas medidas não forem adotadas, o estado vai continuar enxugando gelo.

Marcelo, o Menor P, controla uma fatia importante do tráfico na Maré. Tem ainda sob seu domínio as favelas Vila do João, Vila dos Pinheiros, Salsa e Merengue, Conjunto Esperança, Timbau, Baixa do Sapateiro e parte importante da Nova Holanda. Marcelo é foragido do Instituto Penal Plácido Sá Carvalho desde 2007, quando deixou a prisão após receber o benefício de cumprir sua pena no semiaberto.

FONTE: O Globo via Resenha do Exército

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Vader
11 anos atrás

Éééé… Pois é…

Parece que a política de “espalha-bandido” do Cabral e seu secretário Beltrame não dá tão certo como a propaganda oficial afirma…

Daglian
Daglian
11 anos atrás

Aprenderam isso com as FARC e certos guerrilheiros que perambulam pelo governo tupiniquim atualmente. Se não for tomada uma ação rígida DE FATO contra estes marginais, essa guerra nunca irá acabar.

Marcos
Marcos
11 anos atrás

Juízes corruptos.
Políticos corruptos.
Policiais corruptos.
Lei frouxa.
Neo cumpanherismo narco bolivariano.
Mentalidade de que o bandido é vítima da sociedade.
O resultado está ai.

Rafael M. F.
Rafael M. F.
11 anos atrás

Que isso aconteça mais e mais vezes, para que nossas autoridades percebam de uma vez por todas que bandido não é vítima.

E isso não é combate. É Terrorismo.

Terrorismo se combate com inteligência para identificação e ações severas para combate.

Deveriam aprender com quem já está nisso desde 2001.

Colombelli
Colombelli
11 anos atrás

Estre programa das UPP é um dos maiores estelionatos eleitorais e farsas ja protagonizados.

A finalidade era, e é, pura e simplesmente afastar os fuzis e tiroteios de uma faixa que será ocupada pelos eventos, nada mais. O interesse não é a real supressão do crime.

Uma ocupação encetada para apenas mover os marginais armados dos locais, mas que não diminuiu em nada a presença deles nas bocas de fumo. A diferença é que agora é o Estado que esta forncendo indiretamente segurança na boca para evitar que outros traficantes a tomem.

Todos os pontos de droga estão funcionais, tudo voltou a ser como antes, exceto a presença muito ostensiva de armas, que ja esta voltando, contudo.

E, veja-se, o que funcionou para a relativa e sazonal pacificação não foi o método diferenciado em si, mas simplesmente o fato de que as UPP contam com maciça presença de efetivo. Ou seja, se sem criar ou alegar ter criado algo de novo, a policia antes apenas tivesse se valido dos mesmos efetivos delas, o resultado seria o mesmo.

Notem, ainda, que o Rio hoje tem praticamente 1000 favelas. Se cada UPP conta com efetivo de 300 a 500 policiais, pacificar relativamente o Rio faria com que a PM-RJ viesse a ter mais efetivo que as forças armadas.

É simples, este programa não chega nem perto de atingir uma resolução do problema daquela cidade. Não sei se haverá uma solução havendo 15000 fuzis espalhados. E quando um bando armado chega a 50 ou 60 pessoas, ou pel ref ou dois pelotões, so com artilharia se debela. Se eles quiserem, com um efetivo destes, eles escoram quem quiserem em uma posição de comandamento.

O Cabral, bem este é o que há de pior na política nacional, so perdendo para o chefe supremo. Basta acontecer um sinistro e ele aperece para se locupletar eleitoralmente. Lembram os eventos da serra fluminense? Ainda tem casas e ruas que não foram reconstruídas. Onde foram os mais de 100.000.000 de recursos federais? Por que todo ano se repete? Uso ele e lula como parâmetros. Quero ser a antítese deles.

Mas o Beltrame, este eu tenho pena, pois é um bem intencionado sendo usado.

Solução talvez fosse o método “Cap. Nascimento”. Mas com estes dois governos federal e estadual, uma tolerância zero vai ser impossivel. Tirem uma base o Ministro da Justiça defendendo incosntitucionalidade de redução da menoridade penal, tese aliás, ja sufragada pelo relator do projeto de emenda, do PT/PB.

Lamento pelos cariocas. Eles só irão começar a resolver o problema quando encararem que a cidade é um campo de guerra, não mais a cidade maravilhosa que afirmam. Isso é premissa para um começo. E gerra se vence com baixas no inimigo, não com relocações.

Colombelli
Colombelli
11 anos atrás

So para controle, pouco mais de duas horas depois que eu falei das casas da região serrana do Rio, deu no jornal nacional que por coincidência assisti: casas reconstruidas são 1% das prometidas.

3,5 mihões pagos mensalmente em alugueis sociais.

Como ele, o Cabral não se guindou ao poder sozinho, pergunta-se: como ele chegou lá? Com voto. De quem? De muitos dos que agora sofrem.

Ou seja, lei da causalidade: o voto tras consequencias.

Vader
11 anos atrás

A verdade é que poucos cidadãos do país votam tão mal como os fluminenses.

Merecem…

Colombelli
Colombelli
11 anos atrás

Atualizando, por ainda pertinente: Agora a pouco foi aprovado o aumento de pena para chefes de tráfico, cuja pena hoje, prevista na Lei nº 10443, é de 05 a 15 anos. A nova sanção passará a ser de 08 anos a 15 anos.

Adivinhem so qual a posição do partido da presidente e do minsitro da justiça manifestada dentro do plenário, inclusive tentando adiar a votação e mudar o dispositivo que previa o aumento de pena?

Outra pra refletir: Observaram como foi so passar as eleições que o PCC diminuiu as ações em São Paulo? Tirem suas conclusões.

Mayuan
Mayuan
11 anos atrás

Verdade Vader, só não esquece de mencionar nossos maiores companheiros no quesito más escolhas que são os paulistas, eleitores de Erundinas, Serras, Clodovis (ficou mais esquisito ainda no plural) e, nunca nos esqueçamos, de Maluf e seu afilhado Pitta. Não é por acaso que SP anda se afundando no mesmo mar de violência que os que sempre gostaram tanto de criticar.