Por Dirceu Martins Pio em 12/02/2013 na edição 733 do Observatório da Imprensa

vinheta-clipping-forte1A escola pública faliu e está aí o absurdo número de analfabetos funcionais que não nos deixa mentir; contaminada pela corrupção, a polícia encontra cada vez mais dificuldades para manter a ordem nas grandes cidades; sobrecarregada, temos talvez a Justiça mais lenta do mundo; o Congresso Nacional é isso que se vê: quanto mais avançamos em direção ao futuro, mais os congressistas se apegam às práticas do passado, ao fisiologismo. A sociedade ainda preservava um certo encantamento pelo Corpo de Bombeiros, mas pelo que se passou neste sinistro começo de 2013 em Santa Maria, no Rio Grande do Sul, o resto de admiração foi para o espaço. É mais uma instituição que deixa de cumprir a missão para a qual foi criada.

Ora, mas como é que os bombeiros de Santa Maria poderiam prever que um maluco iria soltar fogos de artifício dentro de uma boate abarrotada de jovens? Para evitar a tragédia, não seria necessário prever isso, pois afinal os incêndios não são causados apenas por fogos de artifício e não tem cabimento que o teto de uma casa de shows seja revestido por material altamente inflamável. Nenhuma casa de espetáculos deve ser autorizada a funcionar por uma só noite que seja sem oferecer segurança máxima a seus frequentadores. Todas elas precisam de vistorias de alta frequência.

Fica difícil saber quem nasceu primeiro, se o ovo ou a galinha, mas o certo é que a decadência das instituições no Brasil tem sido acompanhada de perto pela decadência do jornalismo, instituição que teria por razão de existir a missão de fiscalizar o adequado funcionamento de todas as demais.

Fontes radiativas

Faz tempo que o jornalismo fica à espera que as tragédias aconteçam para que possa criar a sensação de que cumpre o seu papel. Uma febre nacional de fiscalização das casas noturnas varre o país, do Oiapoque ao Chuí. O jornalismo mostra-se nessas horas excepcionalmente criativo: contratou especialistas para checar a segurança de casas noturnas em grandes cidades e o prédio onde funcionou, impunemente, a boate de Santa Maria foi reconstituído por recursos cenográficos pela líder das emissoras de televisão.

A febre uma hora passa, mas a infecção que a causou ficará latente até a próxima tragédia. E a instituição do jornalismo tornou-se apenas reativa. Sua missão é cumprida por espasmos, de tragédia em tragédia.

Faz 26 anos, por exemplo, que uma cápsula de material radiativo (césio) foi violada em Goiânia. O aparelho que a continha, de uso médico, foi abandonado por uma clínica dentro de uma edícula e posteriormente vendido a um ferro velho por um “catador de sucatas”. Já existia a Cnen (Comissão Nacional de Energia Nuclear) e a tragédia que vitimou centenas de pessoas demonstrou que a instituição não tinha o menor controle sobre as fontes radiativas espalhadas pelo país. A pergunta que deve ser feita agora é esta: será que a Cnen tem o controle e fiscaliza o uso de todas essas fontes hoje em dia? É de se supor que sim. Será que algum jornal, revista, emissora de TV ou site noticioso esteve na Cnen neste período para saber se existe controle e como esse controle é exercido? É de se supor que não.

O futuro da jovem democracia

Tragédias iguais a essa de Santa Maria ocorrem em qualquer país – é um dos argumentos que estão na agenda do jornalismo. Acontece que, em todas elas, o Brasil é insuperável em matéria de desleixo, negligência, descaso, omissão. Podemos sair de Santa Maria e analisar as tragédias climáticas. O mundo inteiro se espanta com o número de vítimas que estas têm provocado no Brasil por falta de políticas preventivas em comparação com o que se passa em países como Austrália durante a ocorrência do mesmo tipo de evento.

Neste momento, com certeza, numa das dezenas de centenas de áreas de risco espalhadas pelo país, é cometido algum crime contra a segurança pública, seja pela liberação de alvarás de construção sobre encostas e morros, seja pela manutenção de famílias residindo em pontos de altíssimo risco, ou seja por atrasos em obras de necessidade extrema. Os crimes de hoje só serão denunciados após a tragédia de amanhã.

Com instituições em frangalhos e sem jornalismo que se ocupe pelo bom funcionamento delas, que futuro terá a ainda jovem democracia brasileira?

Dirceu Martins Pio é jornalista e consultor em comunicação corporativa

FONTE: Observatório da Imprensa

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Giordani
Giordani
11 anos atrás

A maldição que paira sobre este país tem nome: Lei de Gérson…

erabreu
erabreu
11 anos atrás

É aquela velha mania brazuca de achar que nada, nubca vaio acontecer.
Prevenção? Planejamento? Coisa chata, enfadonha, “paranóia de americano”.
Nós aqui criamos a já velha máxima do: “pra inglês ver” e como não existe justiça nesse país, fica tudo por isso mesmo.
Culpados são os que morreram. Não tinham nada que estar lá.
Aposto como nínguém vai ficar preso por muito tempo. É só esperar a fervura baixar e o assanhamento da imprensa acalmar, que a coisa se ajeita.
E ainda tem gente que pensa que com essa mentalidade vamos ser potência um dia.
Só mudando o povo.