Sob as areias do Saara
Leonam dos Santos Guimarães
Doutor em engenharia naval e mestre em engenharia nuclear, é assessor da Presidência da Eletrobras Eletronuclear e membro do Grupo Permanente de Assessoria da Agência Internacional de Energia Atômica
Apesar do acidente de Fukushima, a demanda por energia elétrica nuclear continua a crescer: 2013 começa com 65 usinas em construção, outras 160 em fase de planejamento e mais 340 propostas. A demanda por urânio será, portanto, cada vez mais elevada. Ao contrário do petróleo, a maior parte do urânio que alimenta as mais de 400 usinas nucleares em operação no mundo vem de regiões politicamente estáveis.
Com o aumento da demanda, uma parte cada vez mais significativa da oferta virá de regiões instáveis. Antecipando esse aumento de demanda (e de preços), as empresas do setor vêm fazendo nos últimos anos movimentos estratégicos, entre os quais a busca por fontes em locais inexplorados, o que inclui o norte do Mali, onde a França está hoje em guerra contra os insurgentes apoiados pela Al-Qaeda. Não há produção de urânio no Mali, mas empresas que lá têm investido na prospecção e pesquisa nos últimos anos, que não são poucas, devem estar arrependidas da decisão.
As quantidades envolvidas, entretanto, dificilmente justificariam uma “teoria da conspiração” sobre a França estar indo à guerra para proteger o acesso ao urânio. Entretanto, a economia política da extração de recursos naturais, incluindo urânio, bem poderia de fato ser um fator da decisão francesa sobre como responder à insurgência no oeste da África em geral. A recente tomada manu militari de uma planta de gás natural na Argélia prenuncia que o alcance da Al-Qaeda na região vai além de Mali e que os islamistas têm as instalações de exploração de recursos naturais como alvo.
O principal foco de preocupação da França é o Níger, único centro de produção de urânio em atividade no norte da África. Entretanto, as fronteiras nacionais no Saara e do Sahel existem, em grande parte, apenas nos mapas. Como no Mali, os tuaregues do Níger têm pressionado o governo para uma maior participação dos rendimentos de extração mineral, inclusive da produção de urânio. Em 2011, o Níger produziu 4.400 toneladas de urânio, sendo o quarto maior produtor do mundo. Duas minas em que a Areva é o principal acionista fornecem cerca de um terço do urânio consumido pelas centrais nucleares da França e grande parte da produção de urânio total da Areva.
No ano passado o governo do Níger, com o objetivo de aumentar a produção para mais de 5 mil toneladas/ano, teria pressionado a Areva para abrir uma mina de Imouraren, um local onde sete funcionários da empresa foram sequestrados pelos rebeldes em 2010. A tomada de reféns foi numa instalação de produção de urânio localizada no deserto, a 900km a nordeste da capital, Niamey. A segurança deficiente, fornecida por empresas dirigidas por ex-rebeldes tuaregues desarmados teria permitido aos insurgentes acessar suas vítimas facilmente. Os rebeldes executaram um refém francês e a Al Qaeda assumiu a responsabilidade. Logo após os sequestros, os militares franceses intensificaram sua presença aérea no Níger. Em 2007, ao mesmo tempo que os investidores estrangeiros estavam se preparando para prospecção de urânio no Mali, o governo do Níger terminou sua parceria exclusiva com a indústria francesa.
O Níger exigiu mais compensações da França pelas operações de mineração de urânio, vendeu no fim de 2012 dezenas de direitos de prospecção a investidores não franceses e apoiou as demandas dos tuaregues para compartilhar as receitas da produção de urânio da Areva. A concessão de direitos de prospecção para uma indústria chinesa gerou tensões entre tuaregues, levando ao sequestro de profissionais chineses que atuavam na área. Os tuaregues fizeram, em 1995, um acordo com o governo do Níger para cessar o conflito então existente em troca de 10% e 15% das receitas provenientes das operações de mineração de urânio.
Dois anos mais tarde, um grupo separatista retomou a violência contra o Estado, seguido por um acordo de paz que, por sua vez, deu origem a novos conflitos, devido à escassez de água, condições de trabalho e degradação ambiental. Em 2007 foi formado um movimento separatista tuaregue, que exigiu maior compensação das receitas do urânio e melhor proteção ambiental. O aumento da insurgência apoiada pela Al Qaeda poderia ser explicado pelos tuaregues terem buscado um aliado mais forte para fazer valer suas reinvidicações. A resolução do conflito atual apenas atenuará as ameaças de segurança de mineração na região no longo prazo, pois não só urânio, mas também outros minérios estratégicos, sob as areias do deserto, estão em jogo.
FONTE: Correio Braziliense via Resenha do Exército
Mas França é tão boazinha…
Kd os esquerdopatas, detratores dos EUA???
Malhavam os americanos pela ação unilateral no Iraque.
Mas e a França, que só se meteu no Mali, p/ assegurar os negócios da Areva???
Boazinha a França.