Chavismo, lulismo e El Cid
Eles foram populistas populares na mesma época e, de tanto poder, intitularam livros que juntaram um “ismo” ao final de seus nomes. O sufixo implica um líder acima dos partidos, conduzindo multidões anos a fio. Ambos lideraram movimentos populares, mas quão duradouros? Por vias diversas, os legados de Hugo Chávez e Luiz Inácio Lula da Silva estão à prova.
Nem todo governante que desfruta de popularidade em algum momento do mandato acaba substantivo. A “Era FHC” virou título de livro sem que houvesse um “fernandohenriquismo”. A herança do tucano foi estruturante para o Brasil, mas impessoal. Crismando Aécio Neves, o ex-presidente tenta reescrever seu testamento.
O personalismo é um divisor entre presidentes. Chávez levou a mitificação ao limite. O congênere brasileiro ficou a meio termo. Lula adotou a continuidade sem continuísmo. Já o venezuelano apostou que nunca viria a faltar.
Afora o simbolismo, o tratamento em Cuba oferece mais do que qualidade médica. Garante sigilo e provoca boatos contraditórios sobre a saúde de Chávez. A opacidade serve ao modelo cubano-chavista. Se houvesse transparência, seria mais difícil sustentar a versão de que o presidente reeleito pode ter sua posse adiada por não se configurar a “ausência permanente” que – manda a Constituição da Venezuela – provocaria nova eleição.
No Twitter, venezuelanos comparam a situação do “chavismo” à dos castelhanos que criaram o mito de El Cid. Pela lenda, o corpo sem vida do cavaleiro símbolo da reconquista ibérica foi assentado em sua montaria para parecer imortal e afugentar os inimigos. A metáfora é tentadora, embora precipitada. No Brasil, a prática de congelar presidentes está, felizmente, superada.
Antes de Lula, só o “getulismo” durou além de Vargas, após se espalhar de sul a norte. Seus fiéis trataram de cumprir a profecia do líder de que, ao deixar a vida, ele entraria na história. Os demais caciques ficaram limitados no espaço – como as tribos de carlistas, malufistas e brizolistas – ou no tempo: o “janismo” não sobreviveu a seu inspirador.
Os “ismos” colam bem em espanhol. A Argentina saiu do “peronismo” para cair no “kirchnerismo”. Em ambos os casos, a popularidade do marido foi herdada pela viúva. No Brasil, a transição pela via feminina se deu em vida. Mas o sucesso inicial não responde à questão de sempre: por quanto tempo?
Chávez não deixa uma, mas dezenas de herdeiros, de concepções diferentes. Eles propagandeiam união, só por conveniência da possível eleição que se avizinha. Mesmo que ganhem, o que será um governo “chavista” sem Chávez? Prevalecerá o militarismo nacionalista dos ex-oficiais do Exército tornados políticos? Ou o socialismo pró-Cuba do vice-presidente e suposto sucessor?
As contradições são mais do que aparentes. Enquanto o presidente da Assembleia Nacional, Diosdado Cabello, passa o rolo compressor na oposição parlamentar e imita os arroubos de Chávez (“Estamos prontos para o debate, mas não para a negociação”), seu rival, o vice Nicolás Maduro, conversa discretamente com os EUA para restabelecer relações diplomáticas plenas.
O “chavismo” ainda precisa passar pelo teste das urnas sem o nome de Chávez entre os candidatos. O “lulismo” passou. Mais do que isso, incorporou milhões de eleitores pobres ao petismo ao longo da última década. Numericamente, o legado de Lula superou o que o PT perdeu por causa do mensalão.
Segundo o Ibope, o PT saiu de 8% da preferência nacional em julho de 1989 para 33% em março de 2010. A trajetória de crescimento teve altos, associados às vitórias eleitorais de Lula (33% em março de 2003 e 2010), e baixos, durante a denúncia e julgamento do mensalão (24% em junho de 2005 e outubro de 2012). No caminho, mudou o perfil socioeconômico dos petistas. A nova classe média tomou espaço da elite sindical-universitária.
A mágica que popularizou o PT foi o aumento de renda e crédito que incluiu dezenas de milhões de neoconsumidores ao mercado nacional. O PSDB finalmente se deu conta de que não há como fazer oposição sem confrontar o petismo na economia. Daí conduzir o debate para os baixos índices de crescimento do PIB em detrimento, por exemplo, da queda das taxas de desemprego.
No Brasil e na Venezuela, a batalha é pela opinião pública. A diferença é que Dilma Rousseff cavalga ao lado do padrinho vivo, enquanto os herdeiros de Chávez manobram à sombra de El Cid.
FONTE: O Estado de S. Paulo
FOTO: AFP
Mais política… por que não colocar assuntos de defesa de verdade? Vocês não tem sobre o que mais falar?
Chamo atenção para uma especificidade do texto: o suposto tratamento de “qualidade” que existe em Cuba.
É interessante que a medicina cubana seja chamada de 1º mundo quando os equipamentos de altíssima tecnologia atuais, presentes em países da Europa, nos EUA ou no Japão, por exemplo, não estão presentes em Cuba. Quando o intercâmbio de profissionais cubanos para outros países não ocorre, ao menos não oficialmente.
Eu preferiria pagar para um tratamento médico em um hospital particular brasileiro a um tratamento em Cuba. Hugo Chávez só está em Cuba por pura ideologia.
Caro Daglian,
Concordo com vc! E digo mais: essa “medicina de qualidade” em Cuba, para mim, é não mais do que pura propagando, notadamente desde o fim da União Soviética, que despejava dinheiro naquele país.
Sds
O Chavez está descobrindo a duras penas o quão boa é a medicina “de 1o mundo” de Cuba…
Senhores,
É ótimo que o caudilho tenha ido se tratar em Cuba.
Logo estará morto e seu regime durará apenas o tempo que conseguirem capitalizar a morte do “mártir do bolivarianismo”.
Isto será bom para Cuba, cujo regime terá sérias dificuldades sem o apoio venezuelano; será bom para a Colômbia, pois as FARC perderão o apoio (velado) vindo da Venezuela; será bom para o Equador e a Bolívia, cujos caudilhos locais sempre contaram com o apoio financeiro e, por assim dizer, ideológico do ditador venezuelano.
E será bom para o Brasil, pois tem muito idiota aqui dentro que acha o antiamericanismo do Chávez o MÁXIMO.
Logo “Esteban” estará queimando em fogo brando com o coisa-ruim espetando-o com o tridente.
“Esteban”?
É o apelido do Chávez na Venezuela: é o diminutivo de “Este-ban-dido”.
Nesse quesito o Lula foi mais esperto: bolivarianismo à parte, vivam os hospitais Albert Eintein e Sírio Libanês…
Eu ia falar o que o Aldo Ghisolfi citou.
Se o Chávez fosse experto, se tratava no Sírio Libanês.
Foi dar uma de “comuna anticapitalista”… #sifu.
Eu acho que Chaves não veio se tratar no Brasil porque aqui os jornais dariam cobertura total e isso ele não queria dado a gravidade do seu estado de saúde. Lá em Cuba é tudo controlado e ele pode estar até morto que isso só vai ser noticiado quando for conveniente para os seus herdeiros bolivarianos na Venezuela. Aliás, lá fora as notícias na internet falam que ele morreu mesmo, vai saber.
Se el chavo és esteban…o que sobra pro rei-sol, farol da humanidade, Lulankamon I?
A Venezuela caminha a passos largos para uma guerra civil, pelo menos é esta a impressão que eu tenho. O regime de Chaves é heterogêneo, ele comanda várias facções distintas, entre as menos e as mais radicais, ele (e isso é uma qualidade dele) é o elemento pacificador e integrador delas, e só ele. Se ele morrer e se manterem unidas, pode ser que a Venezuela experimente algo como o regime chinês, desde que dê uma guinada econômica que gere sucesso nesta área, mas se cada uma delas for para um lado, a tendência é o pior tipo de guerra civil, a guerra civil de parceiros ideológicos por um butim, um resto de poder existente em um momento anterior, que é muito pior que uma guerra contra um verdadeiro inimigo, até porque a oposição na Venezuela é desarticulada e provavelmente não entrará em confronto, sabe que mesmo não perdendo, também não ganharia nada. Particularmente, penso que o melhor seria que o vice-presidente assumisse, ele é tido como conciliador e negociador, um moderado que saberia inclusive trazer parte da oposição para o seu lado na eventual necessidade de evitar conflito. Mas o fato é que no mínimo, há três facções políticas dentro do Chavismo que vão lutar pelo poder (a de Maduro, a da Assembléia Nacional e a do Judiciário). E nem falemos em democracia, esta, se voltar à Venezuela, só em 10, 15 anos…
Quanto a medicina de Cuba, não há o que se questionar. Os médicos vivem em intercâmbio no exterior (EUA inclusive) e é uma das poucas coisas que traz dividendos para a ilha castrista/comunista (alem do turismo e dos charutos). Eles possuem uma boa tecnologia de medicamentos imunobiológicos. Lembro das palavras de duas pessoas que compram tecnologia de medicamentos (interferon e alfapoetina) de Cuba. Uma gerente da área de bacterianos da empresa onde trabalho disse: “Como esses desgraçados (no bom sentido) conseguem desenvolver essas coisas com o equipamento completamente obsoleto que têm”? E minha diretora fez uma afirmação, já que é ela quem paga “Cuba é comunista só das fornteiras pra dentro, pois eles gostam muito é de dinheiro”!
tem gente que escreve por puro emocionalismo, cuba tem sim uma medicina avançada, e fazem intercambio até mesmo com os eua.