Dissuasão extrarregional é conto de fadas
General da Reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva*
“A Nação que confia mais nos seus direitos do que em seus soldados engana a si mesma e cava sua ruína”. Rui Barbosa.
Segundo a lógica das grandes potências, as soluções aos desafios à ordem internacional – governança e segurança globais, segurança energética e ambiental, e outros – devem atender aos seus propósitos de manutenção do status de poder mundial. Para os países menos poderosos, ao contrário, tais soluções significam ingerência externa, insegurança nacional e limitação de soberania. É o caso do Brasil, diante de pressões dominantes, em virtude da debilidade militar, industrial e científico-tecnológica, setores onde o País é dependente.
Os estudos consideram a garantia de acesso a recursos estratégicos e a presença ou o controle de áreas geográficas importantes, do ponto de vista político-militar, como indutores de conflitos futuros em qualquer parte do planeta, hoje apequenado pela globalização. Julgam muito improvável o choque direto entre os poderes globais, mas que haverá conflitos periféricos e de baixa intensidade com o emprego direto ou indireto do poder militar. Ora, os conflitos entre EUA e Iraque podem ter sido periféricos e de baixa intensidade para os EUA, mas não na visão iraquiana. O mesmo raciocínio deve ser feito para classificar um eventual choque militar entre o Brasil e uma potência ou coalizão de potências envolvendo interesses na Amazônia ou no Atlântico. Para o futuro da Nação brasileira seriam centrais e decisivos, jamais periféricos e de baixa intensidade.
A Política Nacional de Defesa (PND) definiu defesa nacional como o “conjunto de medidas (—) com ênfase no campo militar, para a defesa do território, da soberania e dos interesses nacionais contra ameaças (—) potenciais ou manifestas”. A Estratégia Nacional de Defesa (END), por sua vez, concluiu que os ambientes “não permitem vislumbrar ameaças militares concretas e definidas” e, por isso, as Forças Armadas (FA) devem se preparar em função de capacidades e não de ameaças. Ora, capacidade sem um contraponto é conceito vazio. Ao não se ter a noção do poder de um oponente, ainda que potencial, como determinar o desenho de FA com capacidade para dissuadi-lo ou vencê-lo? Foi gravíssimo o erro de não levantar, como preconizado na definição de defesa nacional, as ameaças potenciais contra as quais o Brasil deveria se preparar desde já, pois defesa não se improvisa. Tais ameaças são perfeitamente identificáveis até pelos leigos em temas de defesa – uma potência global ou uma coalizão de potências em choque com o Brasil, envolvendo interesses vitais, particularmente na Amazônia ou no Atlântico. Como se vê elas não precisariam nem deveriam estar denominadas na END.
A END ressalta a necessidade de ampliar a participação popular nos processos decisórios da vida política. Levar a defesa nacional aos meios acadêmicos e empresariais e à mídia é importante, assim como seria a criação de ONGs nacionais voltadas para o tema. Porém, os representantes da Nação estão no Congresso Nacional onde existe, em cada Casa, uma Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Hoje, tramitam no Congresso os projetos de atualização da PND e da END, elaborados pelas FA sob a direção do Ministério da Defesa, com pouca participação de estudiosos civis e militares da reserva.
Os textos, em função das estruturas hierarquizadas, refletem as ideias do decisor em cada escalão, que podem não ser as melhores. Ao apreciar os projetos em pauta, as Comissões deveriam ouvir civis estudiosos e militares da reserva em audiências públicas e, em audiências reservadas, altos chefes militares da ativa com o compromisso de emitir a própria opinião. É desperdício não conhecer o pensamento de profissionais em quem a Nação investiu mais de trinta anos em contínua preparação, pois assunto de tamanha relevância não deve ficar subordinado a interpretações equivocadas do que seja disciplina intelectual. Tal procedimento deveria ser comum nos projetos de defesa em tramitação no Congresso, pois ali está, em última análise, a própria Nação. De posse do contraditório, as Comissões enviariam os questionamentos relevantes ao Ministério da Defesa, solicitando resposta por escrito ou por um representante para defender a posição do Ministério em audiência reservada, se necessário o sigilo.
A END falhou ao determinar a elaboração de projetos separados de reequipamento e articulação e não de um Projeto Conjunto de Forças, traduzido num Sistema Único de Defesa Antiacesso. Esse Sistema, interagindo com o Sistema Brasileiro de Inteligência, seria composto por subsistemas integrados de vigilância, com satélite brasileiro; defesa antiaérea; mísseis de longo alcance, com plataformas móveis terrestres, navais e aéreas tripuladas e não tripuladas; e por forças terrestres móveis para engajar o inimigo que acessasse os limites nacionais. O propósito seria neutralizar ou desgastar uma esquadra ou exército inimigo enquanto ainda estivessem longe do litoral ou da fronteira oeste. Na falta de armas de destruição em massa, o sistema seria dissuasório por restringir a liberdade de ação de potências extrarregionais.
O Brasil levará cerca de trinta anos para alcançar a autonomia industrial e científico-tecnológica requerida para ter dissuasão extrarregional, que só será confiável se o colocar entre as dez maiores potências militares. É um salto ousado, mas que não acontecerá, haja vista a histórica irrelevância da defesa nacional nos investimentos dos governos.
*Professor emérito e ex-comandante da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército
FONTE: www.averdadesufocada.com
Discordo do nobre General. Como que defesa não se improvisa? A nossa foi improvisada por toda nossa história!!! Desde a Guerra do Paraguai que somos pegos “de calça curta” pela história do mundo! Naquela guerra, estávamos prontinhos para lutar na Guerra de Independência contra Portugal; na Primeira Guerra, estávamos preparadíssimos para acabar com os Farrapos; e na Segunda Guerra Mundial estávamos prontinhos para esmerilhar os fanáticos de Antônio Conselheiro! O famoso “exército pra caçar cangaceiro” que nossos amigos e parceiros, os franceses, nos deixaram ter… Falo dos franceses mas somos “melhores” que os franceses: estes estão sempre preparados para lutar… Read more »
Concordo Vader! Como diz o Reinaldo Azevedo ” O inimigo agora é o mesmo”
Vader escreveu: “… O famoso “exército pra caçar cangaceiro” que nossos amigos e parceiros, os franceses, nos deixaram ter…”.
Vader, varias vezes li queixas sobre a Missão Francesa que treinou o EB.
Uma das queixas era de que a Missão preparou o EB para lutar na Europa e não na America do Sul!
Foi tudo ensinado sem levar em consideração o cenário, e dificuldades sul americanas.
Bacchi
É triste, mas é realidade:
” … Porque sobrevivemos até hoje? Porque somos grandes, e porque somos irrelevantes: sai mais barato comprar o país através de nossos políticos do que invadí-lo. Não fosse isso e já teríamos sido repartidos em vários países.”
Enquanto tivermos PROJETOS DE PODER (POLÍTICOS DE HOJE) e não tivermos um PROJETO BRASIL, a Defesa Nacional será assim, ainda mais com esses recalcados no poder que até hoje querem se vingar das Forças Armadas!
Infelizmente, as pessoas de bem em nosso País não querem saber de ingressar na Política brasileira, então vai ficar difícil!!!