Quatro anos após a 1ª UPP, PMs voltam a usar apenas pistolas, além de armas não letais

 

Diego Barreto

Arma que simboliza, como um estigma, os grandes confrontos entre a polícia e criminosos ao longo dos últimos 30 anos, o fuzil começa gradualmente a sumir das ruas do Rio. Reflexo do processo de pacificação, que completa quatro anos na próxima semana, a substituição do armamento de grosso calibre por armas de choque (não letais) e pistolas, noticiada por Ancelmo Gois em sua coluna no GLOBO, foi confirmada ontem pela Polícia Militar. A iniciativa, que inicialmente está sendo implantada em regiões onde as favelas receberam Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), já retirou do patrulhamento dessas áreas 273 fuzis.

De acordo com a PM, parte das equipes de patrulhamento de Zona Sul, Centro, Tijuca e outras áreas do estado já trabalha com armas não letais e pistolas no lugar de fuzis. Um total de 1.265 tasers (armas de choque) foi entregue aos policiais. Em três favelas pacificadas – Dona Marta (em Botafogo), Jardim Batam (Realengo) e Chapéu Mangueira (Leme) – fuzis também não são mais usados. O processo de troca começou em maio no Dona Marta, a primeira favela pacificada da cidade – a ocupação começou em 19 de novembro de 2008.

Outras cinco áreas com UPPs seguem o mesmo caminho: Ladeira dos Tabajaras e Morro dos Cabritos (Copacabana); Providência (Centro); Morro da Formiga (Tijuca) e Morro do Andaraí. Nessas favelas, apenas equipes de supervisão das UPPs ainda portam fuzis. O objetivo da corporação é, ao longo dos anos, apenas unidades especiais como o Bope e o Batalhão de Choque utilizarem armamento pesado.

O comandante-geral da PM, coronel Erir Ribeiro da Costa Filho, disse que a substituição de armamento de guerra por armas não letais e pistolas significa uma grande mudança na corporação.

– Isso representa uma transformação da cultura que nós, policiais, tínhamos, de que o fuzil resolvia os conflitos. Hoje a pacificação transformou essa questão – disse, acrescentando que alguns fuzis já estão sendo aposentados. – Alguns fuzis estão sendo levados para áreas onde o seu uso ainda é necessário, outros já estão sendo guardados. Ao longo do tempo, isso deve se estender a outras regiões do estado, até que o fuzil seja utilizado somente por unidades especiais. Acredito que dentro de alguns anos vamos aposentar os fuzis das ruas.

Especialistas elogiam a iniciativa

A substituição do armamento de guerra recebeu a aprovação de especialistas em segurança pública. Antropólogo, instrutor de tiro e ex-capitão do Bope, Paulo Storani foi um dos que aplaudiram a iniciativa.

– A velocidade de um projétil de fuzil é alta, assim como a transferência de energia. No corpo humano, os estragos são enormes. A onda de choque provocada pela bala causa a destruição do tecido, que se liquefaz quando atingido. Dependendo do ângulo e da distância, a bala pode se esfacelar ao atingir uma parede, causando ferimentos em várias pessoas próximas. O fuzil é capaz de atingir com precisão um alvo a até 400 metros de distância. Mas o projétil pode percorrer uma distância de até quatro mil metros. Foi desenvolvido para ser usado em guerras convencionais, tendo capacidade de perfurar um capacete de aço e matar o oponente – explicou Storani.

Ele lembrou que o fuzil começou a ser usado na década de 90, em resposta aos arsenais adquiridos pelas facções criminosas:

– No início dos anos 90, os criminosos começaram a utilizar esse tipo de arma. Em 1995, os primeiros fuzis da PM foram emprestados pelas Forças Armadas. Inicialmente, só o Bope usava. O fuzil foi responsável no estado pelo aumento da letalidade nas operações policiais, com mortes de inocentes, policiais e traficantes. A retirada desse armamento do patrulhamento das ruas é muito positiva. É um grande indicador de sensação de segurança maior nessas áreas pacificadas. Criar uma nova cultura sem fuzil vai demorar um tempo. Haverá resistência de policiais que viveram confrontos.

Para o sociólogo Ignácio Cano, professor e coordenador do Laboratório de Análise de Violência da Uerj, sem a presença de traficantes fortemente armados, o uso de fuzis por policiais não se justifica:

– A iniciativa representa a ruptura com um modelo de guerra. Com os espaços recuperados dos criminosos, não se justifica a presença de policiais com armas de alto poder. Tem que se desmontar a associação de táticas de guerra com policiamento. Isso naturalmente deve começar pelas áreas pacificadas. Depois, é preciso que haja expansão para outras regiões.

Presidente da Sociedade Amigos de Copacabana e do Conselho de Segurança Comunitária do bairro, Horácio Magalhães disse que a presença de armamento pesado nas mãos de policiais cria a impressão de confronto iminente, o que não reflete a realidade da região hoje:

– Essa mudança é muito positiva. Se a área está pacificada, é um contrassenso ver o policial portando essas armas.

Opinião semelhante tem a vice-presidente da Associação de Moradores de Vila Isabel:

– Sempre defendemos o policiamento comunitário no bairro, com um maior envolvimento dos policiais com os moradores. Nos países desenvolvidos, o patrulhamento é feito até sem armas. Por isso, considero uma medida boa a retirada dos fuzis.

A medida também pode evitar casos como o do menino João Roberto, de 3 anos, morto em julho de 2008, na Tijuca. PMs atiraram no carro dirigido pela mãe do garoto, ao confundir o veículo com outro ocupado por bandidos. Os disparos foram feitos com fuzil.

FONTE: O Globo, via Resenha do EB

FOTO: AP

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rsbacchi
rsbacchi
12 anos atrás

Comentário absurdo!!!

A policia deve estar armada para poder enfrentar os fora da lei!!!

O resto é papo furado.

Bacchi

aldoghisolfi
aldoghisolfi
12 anos atrás

Agora sim… a polícia está a um passo do bodoque…

Marcos
Marcos
12 anos atrás

Algumas sugestões de nome para a tropa de choque da PM do Rio:

– Bambi

– Letal Pink

Bosco Jr
Bosco Jr
12 anos atrás

Há de se pagar um preço por se estar do lado da lei e preferencialmente, da justiça.
Fuzil não é arma para polícia.
A polícia deve se armar com “inteligência”, superioridade numérica, equipamentos de proteção individual, sistemas de vigilância, comunicação, um sistema judiciário eficaz, leis severas que são cumpridas, uma política de tolerância zero, incentivo à legalidade, etc.
Armas letais da polícia comum deveriam ser a pistola e a espingarda 12. Também é aceitável a submetralhadora, preferencialmente no modo “semi”.
Grupos táticos especiais sim, altamente treinados e em quantidade reduzida, podem contar com fuzis de assalto (preferencialmente sem o modo auto e dotados de mira sofisticada), fuzis de precisão, lançadores de granadas, etc.
Tais grupos especiais deveriam acompanhar os grandes contingentes que invadem o morro dando cobertura em pontos chaves. Seria mais produtivo e seguro do que mandar um bando de homens, todos armados de fuzis, subir o morro de forma desordenada.
É inaceitável que a polícia atire morro acima, efetuando fogo supressivo, sem um alvo definido, com fuzil automático e com metralhadora.
Engraçado que no Brasil todos os dias víamos a polícia atirando a esmo morro acima mas nunca se viu um atirador de elite usando um fuzil de precisão abater um presidiário torturando um refém numa rebelião no presídio, ou abater um sequestrador com um tiro de fuzil.
Já morro acima, com munição 7,62 mm, que perfura 20 casebres de madeirite, numa região cheia de inocentes, aí pode?
Essa foto ai de cima é singular. Os dois modelos de fuzis de assalto estão dotados de simples miras de ferro.
Tudo bem que polícia tem que se proteger, mas e a população inocente, quem é que a protege de projéteis e de armas de guerra?
Quer dizer que se os bandidos usarem metralhadoras é lícito a polícia usar um helicóptero com uma “minigun” em nome de um pretenso direito a autodefesa? Eu acho que não.
E felicito a iniciativa da polícia do Rio.

Bosco Jr
Bosco Jr
12 anos atrás

Sem falar que a distância média de combates em aglomerados urbanos tipo “favela” não deve ser na grande maioria das vezes muito maior que o alcance útil de uma submetralhadora, tornando-se o fuzil completamente inadequado para armar o grosso da tropa, devido a uma série de fatores.
É mais pesado e comprido do que o necessário, o que dificulta o uso em ruelas apertadas, etc.

Mauricio R.
Mauricio R.
12 anos atrás

Nunca é a bandidagem, armada de fuzís, que mata algum inocente, mas sempre a polícia.
Mto estranho isso…

aldoghisolfi
aldoghisolfi
12 anos atrás

Acho que a polícia precisa vencer e não vai ser usando de falácias que ela vai conseguir isso. Como criaram a situação, a bandidagem vai poder matar o polícia a uma distãncia que o armamento dos tiras não poderá nem mesmo chegar perto. Vai ser tiro-ao-alvo! E, evidente, o alvo será o tira…

erabreu
erabreu
12 anos atrás

Bosco,
Infelizmente a vagabundagem so respeita “poder de fogo”.
Fugiram que nem ratos quando as forcas de segurança usaram blindados de verdade.
Concordo que não deveria ser generalizado o uso do fuzil, mas a sua retirada completa emascula o policial comum.

Quanto ao resto: “A polícia deve se armar com “inteligência”, superioridade numérica, equipamentos de proteção individual, sistemas de vigilância, comunicação, um sistema judiciário eficaz, leis severas que são cumpridas, uma política de tolerância zero, incentivo à legalidade, etc.”, pode esquecer.