Blindados no Haiti
Coordenador do Centro de Pesquisas Estratégicas “Paulino Soares de Sousa”, da UFJF.
A obra de Expedito Carlos Stephani Bastos intitulada: Blindados no Haiti – Minustah, uma experiência real (prefácio de Eduardo Magrone, Juiz de Fora: UFJF/Defesa, 2012, 106 páginas) constitui mais uma valiosa contribuição deste autor aos estudos estratégicos, aos quais se dedica, há várias décadas, no âmbito da tecnologia militar brasileira e internacional. Trata-se, pela amplitude e a novidade das informações contidas, pela exatidão dos dados técnicos apresentados, pela qualidade editorial, bem como pelas imagens que enriquecem o conteúdo, todas pertencentes ao arquivo do autor , de obra de leitura obrigatória para os interessados em assuntos estratégicos. O livro em apreço constitui, certamente, o melhor manual de blindados no Haiti hoje existente. A pesquisa que deu ensejo ao livro incluiu uma visita do autor ao Haiti em junho de 2008, a convite do Ministério da Defesa do Brasil.
Formado em eletrotécnica e eletrônica e bacharel em Direito, o autor é membro do conselho de curadores na área de blindados e veículos militares do Museu Militar Conde de Linhares (no Rio de Janeiro), bem como integrante honorário do corpo docente do Centro de Instrução de Blindados General Walter Pires (em Santa Maria, Rio Grande do Sul). Foi professor visitante de História Militar na Academia da Força Aérea de Pirassununga, São Paulo (1991-1993). Em 2003 foi condecorado com a Medalha Legião do Mérito do Engenheiro Militar no grau de Alta Distinção, pela Academia Brasileira de Engenharia Militar (São Paulo). Expedito Bastos é responsável pelo portal UFJF/Defesa (www.ecsbdefesa.com.br), que trata de história militar, defesa, estratégia, inteligência e tecnologia. É membro fundador do Centro de Pesquisas Estratégicas “Paulino Soares de Sousa”, da Universidade Federal de Juiz de Fora, onde coordena a área de tecnologia militar. No campo editorial, Expedito Bastos é autor de inúmeros artigos publicados no Brasil e no exterior (Portugal, Espanha, Itália, Alemanha), sendo, atualmente, membro do conselho científico das revistas espanholas Asteriskos e Strategic Evaluation, bem como correspondente da revista alemã Tecnologia Militar, publicada no Brasil pelo grupo editorial Mönch. A obra que ora comentamos insere-se no conjunto de outras publicações do autor sobre história da tecnologia militar brasileira, com os livros intitulados: Blindados no Brasil: um longo e árduo aprendizado (2 volumes, Bauru: Taller Comunicação; Juiz de Fora: UFJF Defesa, 2011) e Renault FT-17, o primeiro carro de combate do Exército brasileiro (Bauru: Taller Comunicação; Juiz de Fora: UFJF Defesa, 2011).
O livro Blindados no Haiti – Minustah, uma experiência real, consta de uma Introdução, dois capítulos (“Blindados” e “Lições do Haiti”) e uma Conclusão (dividida em duas partes: “Hora de retirar as tropas” e “Depois do terremoto”).
Na Introdução, o autor faz uma rápida síntese da história política do Haiti, se detendo nos aspectos estratégicos que acompanharam o surgimento desse país independente, no início do século XIX. A seguir, descreve as tropas e os equipamentos do efetivo internacional das Nações Unidas no Haiti até o final de 2011, que totalizava 8.520 homens provenientes dos seguintes países: Argentina, Benin, Bolívia, Brasil, Canadá, Chade, Chile, Croácia, França, Jordânia, Nepal, Paraguai, Peru, Portugal, Turquia e Uruguai. A estes elementos militares somavam-se, no período analisado, elementos civis e policiais originários dos seguintes países: Argentina, Bunin, Burkina Fasso, Camarões, Canadá, Chade, Chile, China, Colômbia, Egito, El Salvador, Espanha, Estados Unidos, França, Granada, Guiné, Iêmen, Jordânia, Nepal, Níger, Nigéria, Paquistão, Romênia, Federação Russa, Ruanda, Senegal, Serra Leoa, Togo, Turquia, Uruguai e Vanuatu.
O Brasil, que está no comando das operações militares da MINUSTAH (Missão das Nações Unidas para a Estabilização no Haiti) desde 2004, enviou para esse país dezesseis contingentes, sendo que, após o terremoto de 2010, a força se elevou para um total de 2.165 homens divididos em dois batalhões. O autor destaca que a liderança militar do Brasil no Haiti soma-se a outras iniciativas de colaboração em missões de paz da ONU nesse país, ocorridas entre 1994 e 2000 (Missão das Nações Unidas no Haiti, Missão das Nações Unidas de Suporte ao Haiti, Missão de Transição das Nações Unidas e Missão da Polícia Civil das Nações Unidas).
Como pontos positivos da participação militar brasileira na MINUSTAH, o autor aponta os seguintes: preparo individual, treinamento e avaliação dos líderes de frações constituídas, apoio logístico, teste efetivo do material, avaliação da instrução, aperfeiçoamento da doutrina, experiência de missão de paz, importância do estudo de idiomas, emprego de veículos e blindados em áreas urbanas, controle de distúrbios em áreas densamente povoadas e emprego de munição não letal.
Do ângulo estratégico, o autor assinala, como elemento altamente positivo, a integração entre os diversos corpos armados como força policial, ao ensejo da MINUSTAH. Esse fato, projetado sobre a situação de insegurança das nossas grandes áreas urbanas, tem um aspecto positivo, que é ressaltado pelo autor da seguinte forma: “Na prática, estamos realizando o papel de polícia com uma força de paz, o que sempre se evitou fazer no Brasil para enfrentar os grandes problemas de nossas gigantescas cidades. A experiência é válida. Ajudou a compreender o emprego, a utilização e a importância na produção de diversos itens, desde munições não letais até modificações em carros blindados para emprego em área urbana. Se bem absorvida e gerenciada, ela pode nos dar ampla visão para o futuro, considerando que a situação em nossas grandes cidades se agrava devido à ampliação do chamado crime organizado e do combate aos narcotraficantes. E pode ser de grande valia também em áreas de fronteira, onde a função policial é de capital importância” (p. 18).
O autor lembra que a cidade do Rio de Janeiro viveu a experiência de uma intervenção militar e policial conjunta, ao ensejo da tomada, pelas forças da Marinha e do Exército, e por policiais, do Complexo do Alemão, em 25 de novembro de 2010. Esse fato, considera Expedito Bastos, “será lembrado como um marco histórico importante para as operações de blindados no país em área urbana, pelos recentes acontecimentos de uma verdadeira guerra civil, que há tempos vem assolando, principalmente a cidade do Rio de Janeiro (…). O marco histórico tende a ser maior em razão, de mais uma vez, a Marinha do Brasil, através do seu Corpo de Fuzileiros Navais, inovar ao ceder seus blindados; meios de comunicação e outros equipamentos para as Forças de Segurança Pública daquele Estado, entendendo que operações conjuntas sob comando de forças policiais (…) são possíveis de serem executadas sem que tragam qualquer desgaste para as Forças Armadas e sem comprometer sua cadeia de comando” (p. 18)
De forma inédita na história da segurança pública no Brasil, no episódio apontado no Rio de Janeiro houve real integração entre forças policiais e militares, sob comando civil. A respeito, frisa o autor: “O marco histórico é que pela primeira vez, efetivamente, os serviços de inteligência da Polícia Federal, da Polícia Civil, da Polícia Militar e do Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha Brasileira conseguiram conversar entre si, numa importante troca de informações e experiências que alicerçaram toda a operação, a qual num primeiro momento foi um sucesso, mas que precisa ter uma continuidade tão logo encerrem as atividades militares e o Estado possa, de vez, trazer estas áreas como parte integrante das demais na cidade, mostrando que somente ele é quem detém o controle e segurança que tanto almeja aquela população, já há tempos esquecida” (p. 19).
À luz da experiência obtida na MINUSTAH, o autor considera que ficou clara a necessidade de reformar as viaturas blindadas de transporte de pessoal VBTP EE-II Urutu, utilizadas pelas tropas brasileiras no Haiti. Expedito Bastos acha que os mencionados veículos apresentaram algumas deficiências a serem corrigidas nas próximas versões da nova família de blindados médios sobre rodas. Levando-se em consideração as necessidades do emprego em áreas urbanas, essas deficiências estão sendo equacionadas “com o apoio de empresas e do próprio Exército” (p. 21). As deficiências mais importantes do EE-II Urutu dizem relação aos seguintes itens: quatro escotilhas de guarnição, escotilha do comandante, periscópios e blocos de visada do veículo, ergonomia, comunicações e metralhadora sobre o veículo.
No primeiro capítulo intitulado: “Blindados”, o autor analisa os vários tipos de veículos blindados em operação no Haiti. Divide a exposição em quatro itens: a – veículos 4X4, b – veículos 6X6, c – veículos 8X8 e d – o levante de abril de 2008.
No que tange ao item a (veículos 4X4), o autor frisa que esse tipo de blindado é utilizado pelas forças militares e/ou policiais da Argentina, Bolívia, China, Espanha, Nepal, Paquistão, Peru, Senegal e Uruguai. Considera que “o 4X4 deveria ter sido o veículo padrão” para o teatro haitiano “devido às suas pequenas dimensões e grande mobilidade”, além de não existir, ali, resistência muito forte ou com armamento moderno. “No caso dos equipamentos brasileiros que foram enviados – frisa – notou-se a falta de um veículo desse porte; com isso, fomos obrigados a improvisar blindagens adicionais para os veículos Land Rover” (p. 25). No trabalho de adaptação deste tipo de viatura para as condições da missão de paz no Haiti, é destacado o importante papel desempenhado pelo Arsenal de Guerra de São Paulo que, em parceria com a empresa Centigon Blindagens do Brasil produziu o kit de blindagem.
No item b (veículos 6X6), o autor destaca que os seguintes países utilizam esse blindado no cenário haitiano: Brasil, Bolívia, Chile, China, Jordânia e Peru. A maior parte dos veículos em uso é classificada como VBTP (Veículos Blindados de Transporte de Pessoal). É destacado, em relação a este carro, que “a parte mais difícil e perigosa da missão tem sido cumprida por esse tipo de blindado. Eles são empregados em atividades policiais, servindo no transporte das tropas para ocupação de áreas sob domínio de gangues, circunstâncias em que os enfrentamentos são praticamente inevitáveis”. No entanto, frisa o autor, “não existe ameaça de qualquer arma antitanque em uso pelas gangues, limitadas à utilização de armas de baixo calibre, que causam pequenos danos aos veículos” (p. 39). O autor se detém na análise do histórico e do desempenho do 6X6 brasileiro em uso no Haiti, o EE-II Urutu. Embora não seja produzido mais no Brasil, após a falência da Engesa em 1995, o autor destaca que “o EE-II Urutu tornou-se um dos veículos mais famosos já produzidos pela indústria nacional, devido principalmente à sua simplicidade e fácil manutenção” (p. 49).
O Urutu, segundo Expedito Bastos, é, com certeza, o blindado brasileiro de maior sucesso em cenários de conflito. A respeito, frisa: “A nossa experiência com esse veículo em situações extremas tem sido fruto das diversas missões de paz da ONU de que participamos, como Angola, Moçambique e agora Haiti (2004), e também por forças estrangeiras, como os jordanianos no próprio Haiti e ainda em Kosovo, onde diversos deles, últimas versões de série, pertencentes aos Emirados Árabes Unidos, atuaram em situações de controle antidistúrbio, em 2004, na cidade de Mitrovika. Mais recentemente foi possível vê-los patrulhando as ruas da cidade de Tunis, por ocasião da Primavera Árabe, que ali se iniciou” (p. 50). Considera o autor que esse tipo de blindado, com as reformas eficazmente realizadas pelo Arsenal de Guerra de São Paulo, ainda será peça-chave na atuação do Exército Brasileiro, até que seja encontrado um substituto adequado.
No que tange ao excelente desempenho desses blindados no cenário haitiano e em relação ao seu uso futuro ainda promissor no nosso país, o autor conclui destacando o fato de se tratar de veículos concebidos, desenvolvidos e produzidos no Brasil: “Os nossos blindados 6X6 estão se saindo muito bem, mesmo voltando para nova reforma no Arsenal de Guerra de São Paulo em estado lastimável. (…) Seu emprego ocorre em situações extremas e por longo período, o que nunca ocorreu por aqui (…). Enquanto não se define a nova família de blindados sobre rodas 6X6 e 8X8, eles terão de continuar a ser empregados nas missões de paz e precisamos saber até onde se terá bom resultado e quanto tempo mais agüentarão novas reformas, lembrando que tudo isso foi conseguido por se tratar de um produto nacional concebido, desenvolvido e produzido no país. O Arsenal de Guerra de São Paulo está fazendo um brilhante trabalho: até o momento, já foram repotenciados 180 veículos (…)” (p. 58-59).
No item c (veículos 8X8) o autor informa que seis países fazem uso desse tipo de blindados de diversas origens: Uruguai, Sri Lanka, Rússia, Espanha, China e Brasil. O Corpo de Fuzileiros Navais da Marinha brasileira utiliza o mais novo modelo de 8X8 Mowag Piranha. A respeito da impressão que teve no que respeita ao funcionamento desses veículos, Expedito Bastos frisa: “Recentemente adquiridos, eles me impressionaram quanto à sua mobilidade nas ruas de Porto Príncipe. Tive a oportunidade de acompanhar algumas patrulhas diurnas e noturnas, com os integrantes do IX Contingente que lá aportaram no início de junho de 2008, para ocupar o lugar do VIII. Este permaneceu por seis meses no país, enfrentando situações complicadas com esses blindados. De fato, coube ao VIII Contingente seu emprego real em área urbana, densamente povoada. Os resultados foram extremamente favoráveis, consideradas as condições de atuação nos locais” (p. 63).
Em decorrência do tipo de ação que as forças presentes no Haiti devem desenvolver, circunscritas, em sua maioria, ao policiamento de áreas faveladas com ruelas estreitas, o autor aponta a inadequação do veículo 8X8 na estratégia da MINUSTAH, pois, frisa, “(…) quanto maior o veículo menos mobilidade terá ao se deslocar por ruas estreitas com vários obstáculos, tornando-se um alvo em potencial” (p. 59). Os únicos veículos deste tipo equipados com dispositivos antidistúrbios são os chineses. A Marinha de Guerra do Brasil, com o Corpo de Fuzileiros Navais, utiliza sete veículos 8X8, na modalidade Piranha IIIC, quase todos fabricados nas décadas de 70 e 80 do século passado. O desempenho dos mesmos tem sido satisfatório, como foi frisado, notadamente nas ações de apoio a forças de infantaria em missão de patrulha urbana. O autor caracteriza assim a participação deles: “O emprego real desse blindado ocorreu na manhã de 8 de abril de 2008, quando foram chamados às pressas para ajudar no patrulhamento e no apoio ao Ponto Forte 16, em Cité Soleil, bairro pobre da capital. Ao menos um dos veículos resgatou alguns membros da embaixada brasileira no aeroporto internacional, levando-os para lugar seguro, onde permaneceram até o dia seguinte” (p. 64).
No item d – O levante de 8 de abril de 2008, o autor analisa as causas que levaram ao desfecho do mesmo, sendo elas fundamentalmente sociais, ligadas à pobreza extrema e ao desemprego, embora, evidentemente, a ação de agitadores profissionais não estivesse descartada. Dois aspectos são destacados em relação à presença e atuação dos blindados brasileiros nesse evento: de um lado, o importante papel que desempenharam os veículos 8X8 Piranha no patrulhamento em frente ao Palácio Presidencial, para onde inicialmente se dirigiram os revoltosos no dia do levante e, de outro, a participação, na ação de policiamento das ruas vizinhas ao Palácio, dos blindados Urutu do Exército. Tomaram parte nas operações, nesse dia, outros blindados de diversos países (China, Uruguai, Nepal, Sri-Lanka e Bolívia). O desempenho dos veículos blindados brasileiros, tanto os 8X8 Piranha, da Marinha, quanto os Urutu do Exército, é caracterizado pelo autor como positivo.
No que tange ao patrulhamento de área urbana, o funcionamento dos veículos Urutu foi bastante satisfatório, em decorrência, especialmente, das reformas efetivadas pelo militares brasileiros na melhora das condições de defesa. As reformas foram assim sintetizadas por Expedito Bastos: “No caso dos blindados do Exército (Urutu) é possível ver as diversas improvisações que estão sendo agregadas, fruto da experiência de quatro anos de operações em Porto Príncipe. Quando chegaram, como não dispunham de proteção para o motorista e o atirador da torreta, usaram-se inicialmente sacos de areia para proteção das escotilhas superiores traseiras. Algum tempo depois, foram construídas lá mesmo algumas proteções para a torreta do atirador, fechada nas laterais e aberta em cima. A seguir, o motorista ficou mais protegido com a montagem de uma cabine totalmente blindada sobre a tampa da escotilha, que foi removida. Posteriormente, criou-se uma cúpula blindada giratória sobre a torreta, o que deu um aspecto horrível ao blindado, como se estivesse carregando um caixote. Sobre pelo menos uma delas se colocaram dois alto-falantes, transformando-o em veículo de guerra psicológica, que divulgava mensagens na língua local nas operações no entorno do palácio (…) (p. 68).
O autor conclui o capítulo destacando a importância da experiência haitiana, no aspecto relativo ao emprego de blindados em área urbana. Enfatiza que essa experiência se restringe ao aspecto militar e policial, mas destaca que, para a efetiva conquista da paz nesse país são necessárias outras medidas de caráter social, que completem a imprescindível ação policial e militar. A respeito, frisa o autor: “Embora não existam oposição armada e nem facções interessadas em tomar o poder, se não se criar uma diretriz para gerar empregos e tornar a vida da maioria mais digna, a qualquer momento a situação pode sair de controle e, guardadas as devidas proporções, se transformar no nosso Iraque. Basta apenas alguém ficar mais nervoso no enfrentamento, disparar uma rajada de tiros, matar alguns manifestantes – entre os quais sempre há mulheres e crianças – para que a multidão sem controle se torne uma ameaça mortal para as tropas em operação naquele momento. É preocupante” (p. 70).
O segundo capítulo intitulado: “Lições do Haiti”, é dividido pelo autor nos seguintes cinco itens: a – problemas vividos pelos brasileiros com os blindados; b – kits de blindagem: solução paliativa, mas uma grande evolução; c – blindagem de pá carregadeira; d – torreta RCWS 30 “Predador”; e – lagartas.
No item a – problemas vividos pelos brasileiros com os blindados, o autor frisa que o principal obstáculo é de caráter logístico, levando em consideração o acelerado desgaste dos veículos produzido pela adversidade do terreno e a dificuldade para transportar até o embarque, em Porto Príncipe, os blindados avariados. Isso levando em consideração que as forças militares brasileiras carecem de veículos apropriados, dependendo, para isso, do auxílio prestado pelos contingentes de outros países.
Conclui este item com a seguinte anotação: “O certo é que esse laboratório tem dado grande contribuição para o dia a dia da tropa, pois as situações reais criadas pelo tipo de missão são bem diferentes das simuladas ou que ocorrem em manobras da própria unidade ou em diversas outras, ao longo da carreira abraçada pelos membros dos escalões de manutenção e logística que integram o Exército. Um exemplo interessante e que mereceu registro foram as unidades chilenas que dispõem de empilhadeiras de fabricação americana, com capacidade de levantar cargas de até 15 Ton. Como o Urutu pesa 12 Ton, foi possível com uma delas remover, levantar e colocar sobre as pranchas os cinco EE-11 enviados de volta ao Brasil, facilitando muito o trabalho de remoção” (p. 73-74).
No item b – kits de blindagem: solução paliativa, mas uma grande evolução, o autor chama a atenção para a criatividade dos engenheiros militares e dos técnicos auxiliares do Esquadrão de Cavalaria Mecanizado “Paiva Chaves” do Rio de Janeiro e do Arsenal de Guerra de São Paulo, que elaboraram os planos e os protótipos para as reformas, que têm sido efetivadas com o mínimo de recursos disponíveis. Isso levando em conta a mesquinha diminuição do orçamento para manutenção e renovação de armamentos imposta às Forças Armadas pelos governos civis. Essas reformas foram feitas pelo pessoal do Exército, no Haiti ou no Brasil, com a colaboração de empresas nacionais e estrangeiras como La Perfection Machine Shop, de Port-au-Prince e a Metalúrgica Mena e a Centigon Blidagens do Brasil, brasileiras.
Expedito Bastos descreve, assim, o essencial das reformas dos blindados brasileiros: “As situações vividas no contexto do conflito no Haiti, de certa forma, estão levando a algumas modificações importantes no EE-11 Urutu, como adoção de torreta blindada, blindagem para o compartimento do motorista com adoção de uma cúpula, lâminas frontais para remoção de obstáculos e emprego de pneus de caminhão encontrados no mercado nacional. Estes, já usados com êxito pelos colombianos nesses mesmos veículos, agora estão sendo aproveitados por aqui, evitando assim sua importação, como vinha sendo feito. Mantendo seu anel de borracha maciço interno, ele é transformado em pneu à prova de balas. A novidade foi a criação do berço blindado colocado ao redor das quatro escotilhas sobre o compartimento onde são transportados os soldados, pois inicialmente eram usados sacos de areia” (p. 74).
O autor finaliza este item destacando a falta que faz, para as forças brasileiras, um blindado leve: “Toda a experiência brasileira no Haiti nos mostra estar faltando a essas unidades um 4X4 blindado leve, que poderia ajudar em muitas das operações, inclusive limitando o emprego dos 6X6 e reduzindo bastante os desgastes em curso, além de dar melhor mobilidade para o tipo de operação policial que lá estamos exercendo para as Nações Unidas. Com o envio do blindado 4X4 Guará ao Haiti, após fevereiro de 2010, quando se fecha o ciclo de testes do protótipo desenvolvido pela Avibrás, poderemos ter uma nova dimensão quanto ao emprego de um blindado leve em operações urbanas” (p. 78).
No item c – blindagem de pá carregadeira, o autor destaca a importância que, para a segurança das operações de desobstrução de ruas e avenidas, teve a blindagem da pá carregadeira Case W20B, pertencente ao comando do Batalhão Haiti e que é emprestada, quando necessário, à Companhia de Engenharia da Força e Paz. “A blindagem foi feita localmente, – frisa Expedito Bastos – utilizando lâminas de aço usadas em outros equipamentos, que foram soldadas ao redor da cabine, dando boa proteção ao operador (…)” (p. 84).
No item d – Torreta RCWS 30 “Predador” é salientado o grande avanço tecnológico que significou a adoção, pelo Exército brasileiro (mediante parceria entre a Imbel e a Rafael), da torreta automática israelense RCWS 30 (Remote Controlled Weaponstation) que serve para diversos tipos de blindados. A torreta foi acoplada a um dos veículos Urutu em operação no Haiti e realizou, com sucesso, diversas missões diurnas e noturnas. Foi testada executando tiro real com metralhadora .50 e MAG 7.62 mm. O seu acoplamento ao veículo blindado é simples, sendo colocada sobre a carcaça com parafusos. Apenas são necessários alguns cabos para o seu funcionamento. No interior do veículo, o novo dispositivo é ligado a um computador de tiro e, mediante uma tela de cristal líquido, é operado como um vídeo game.
A respeito da novidade tecnológica e tática que essa Torreta representa, frisa Expedito Bastos: “Sem dúvida, sua adoção e produção local darão nova dimensão à força terrestre brasileira, principalmente nas novas missões CLO (Garantia da Lei e da Ordem) e em combates urbanos de baixa intensidade, visto que pode ser facilmente adaptada sobre um blindado 4X4, ou até a um maior, dependendo apenas do tipo de operação. Enxerga praticamente em qualquer situação diurna ou noutra, sem expor qualquer membro da tripulação, permitindo rápida e eficaz resposta no momento oportuno, além, é claro, do fator intimidatório. (…) Operada por controle remoto, capaz de utilizar variada gama de armamento e de fácil adaptação a qualquer veículo blindado, garantirá à tropa grande autonomia e baixíssima vulnerabilidade em suas incursões” (p. 87).
No item e – Lagartas, o autor chama a atenção para a presença, no cenário haitiano, de dois modelos de veículos sobre lagartas utilizados pelas forças jordanianas, num universo em que a maior parte dos blindados funciona sobre rodas. Um deles é o M-113 A1, utilizado para transporte de tropas e que opera com um toldo montado sobre o compartimento do motorista, a fim garantir proteção contra o sol intenso. O outro veículo, conhecido como M-88A1 Recovery foi desenvolvido para apoiar unidades de carros de combate americanos, utilizando componentes do M-60 e funciona como uma oficina sobre lagartas.
Na Conclusão, o autor traça um quadro real da situação vivida, hoje em dia, pelo Haiti. A capital, Porto Príncipe, com 4 milhões de habitantes e com um desemprego que beira os 80%, é um barril de pólvora que pode explodir a qualquer momento. As coisas pioraram sensivelmente depois do terremoto de 12 de janeiro de 2010, que deitou por terra a infra-estrutura do já empobrecido país. Nesse evento, perderam-se preciosas vidas de soldados brasileiros. Para o Brasil, é melhor sair enquanto é tempo e depois de ter cumprido por oito anos, a contento, a missão de chefiar as várias delegações militares que integram a MINUSTAH.
Esta é a conclusão de Expedito Bastos: “O Brasil, ao liderar esta força militar, mostrou sua competência, mas, com a cidade pacificada, são necessários investimentos pesados para gerar empregos e dar futuro para a população, que já viveu períodos bem mais estáveis e prósperos há uns quinze anos, quando estrangeiros de todas as partes do mundo visitavam os belos locais da ilha e toda a infraestrutura funcionava. A questão maior agora é meramente policial: sanear a polícia local, fazê-la assumir o papel que lhe cabe e, junto dos políticos, dar rumo para o país, com apoio da comunidade internacional, para instalar uma base de sustentação com geração de empregos. Essa calma aparente pode a qualquer momento se transformar em revolta popular, bastando apenas alguém para liderar, e se transformar num grande massacre, que jogará por terra todo o trabalho muito bem executado, principalmente por nossas tropas do Exército e Marinha, pois, afinal, temos o maior contingente lá operando. Não podemos ficar indefinidamente no Haiti; precisamos ter uma data-limite para sair, até porque temos nossos problemas internos e nossa presença lá nesses oito anos já custou, segundo noticiado pela imprensa brasileira, quase um bilhão de reais dos quais foram reembolsados algo em torno de 20 % pela ONU. O melhor de nossos soldados e equipamentos está lá e muitas áreas do Brasil estão desguarnecidas, bastando ver o que temos em Roraima, onde a situação tem estado em efervescência. A situação em casa é preocupante, estamos improvisando muito, esticando demais a corda. É melhor sair enquanto ainda somos os senhores da situação, até porque manter tropas lá não é a solução” (p. 95-96).
COMO ADQUIRIR O LIVRO: Seu preço é de R$ 38,50 para compra direta pelo portal UFJF/Defesa – www.ecsbdefesa.com.br. Para adquiri-lo, basta enviar um e-mail para defesa@ufjf.edu.br.
SAIBA MAIS:
Desde quando os Blindados Piranha IIIC usados pelo CFN no Haiti foram “fabricados nos anos 70 e 80”? Os blindados são novíssimos! O cara viajou!
Qnto a essa “necessidade” imperativa de um 4 X 4:
a) O Piranha do CFN corta por dentro do raio de curva do Guará, c/ tdo aquele tamanho.
b) RG-31 e Dingo seriam 2 boas opções, pois além de 4 X 4, foram bastante testados em ambiente carregado de ied’s, do Iraque e no Afeganistão.
Ao passo que o Guará, não.
Realmednte, tem umas pessoas que escrevem umas coisas que não dá para entender de onde tiram, e olha foram lá a presenciaram a operação. Toda a galáxia sabe que o Piranha do CFN é o que se tem de melhor hoje no Brasil em termos VBR(não considero o Guarani porque não está operacional) e aí o cidadão vem aflar esta verborragia Ptânica típíca de universidades esquerdóticas. Pelo amor de Deus, todo mundo sabe as deficiências do Urutu, principalmente nos quesitos blindagem, suspenção e transmissão e o cidadão nem toca nestes furunculos, diz que ó do borogódo, e para para finzalizar… Read more »