Modernidade líquida
Trechos da entrevista de Zygmunt Bauman, que é hoje uma grife da sociologia, lido, citado e compartilhado em toda parte. Esse status se deve em grande medida ao seu conceito de “modernidade líquida”, aplicado às sociedades pós-industriais que perderam o sentido de “pertencimento” – Valor 11/12/13.
1. Era da Reciclagem é viver sob pressão de mudanças constantes e, em geral, imprevisíveis o que favorece uma cultura do esquecimento, em vez de uma cultura do aprendizado e da lembrança. Na sociedade consumista da modernidade líquida, as coisas começam a envelhecer já no momento em que nascem, e a distância temporal entre acolhê-las entusiasticamente e rejeitá-las como ultrapassadas vem se encurtando em uma velocidade cada vez maior.
2. A tecnologia digital, com seu espaço infinito para armazenar informação, intensificou esse processo a que me referi acima: não temos mais necessidade de expandir nossa memória pessoal, na medida em que toda informação existente está mantida em segurança em servidores da Web e pode ser recuperada quando o desejarmos. Hoje podemos esquecer sem nos sentirmos culpados… E fazemos isso. As coisas esquecidas não estão mortas – ou, ao menos, parece. Entretanto, se essa ideia é reconfortante, ao mesmo tempo é enganadora e potencialmente danosa. Nenhuma de suas consequências de longo prazo são realmente encorajadoras. Já seus resultados imediatos são a fragilidade dos limites do homem e o status provisório de quaisquer soluções para os problemas, além das sensações de desconhecimento – mais do que a capacidade de entender- e de impotência – mais do que a capacidade de agir efetivamente e com confiança no resultado.
3. Hoje, o “tempo real” se constitui no padrão em relação ao qual todos os outros tempos são comparados. O valor supremo é a imediatez. Somente o tempo vivido cotidianamente parece e é sentido como “real”. Tudo aquilo que reside no “passado” e no “futuro” foi descartado. Nossas vidas, por assim dizer, são uma sucessão de “momentos presentes” – chamei tal percepção temporal de “pontilhista”, para distingui-la da percepção até então dominante, a de imagens “cíclicas” ou “lineares”. A história é hoje uma série de presentes, e esse presente transitório é a única constância… Em consequência, a incerteza é a única certeza…
4. Mídias sociais são “redes” fazendo o papel das comunidades enfraquecidas. Mercados consumidores: a partir dele, podemos comprar os ícones do pertencimento, mas sem o genuíno auto sacrifício e a autoimolação que o pertencimento na vida real requer…
5. O nacionalismo tem muitas causas – todas elas muito diferentes. Na Europa, o nacionalismo não está em crise porque o que está em crise é justamente a soberania do Estado-nação. Essa é a razão por que o capital político tenta se construir a partir dos medos nascidos de um processo mais amplo de separação entre o poder (a capacidade de fazer as coisas) e a política (a capacidade de decidir que coisas precisam ser feitas).
6. Na verdade, a União Europeia é um escudo que protege os Estados membros de calamidades muito piores, caso ocorresse um divórcio entre eles. Os problemas que os políticos nacionalistas prometem resolver por meio da ressurreição da “soberania plena” do Estado-nação são fadados a se aprofundar, e não serem sanados, pela desmontagem desse escudo protetor. A imigração, outro alvo dos políticos nacionalistas, também não poderia ser suprimida sem minar a economia europeia, seriamente dependente da capacidade e da mão-de-obra importadas.
FONTE: Ex-Blog do Cesar Maia