Por Roberto Rockmann | Para o Valor, de Brasília

O orçamento do Ministério da Defesa, que em 2011 chegou a R$ 60,8 bilhões, é o terceiro maior do governo. Perde apenas para a previdência social (R$ 294 bilhões) e para a área da saúde (R$ 74 bilhões). Mas cerca de 80% dos recursos destinam-se ao pagamento da folha de pessoal, e 63% desse total vão para funcionários aposentados. Apenas 13,7% do orçamento destinam-se ao custeio, e menos ainda – 6,7% dos R$ 60 bilhões – são transformados em investimentos, segundo dados do pesquisador Vitélio Brustolin, que defendeu sua tese sobre o tema na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Brustolin está de malas prontas para os Estados Unidos, onde fará um pós-doutorado em Harvard sobre a indústria de defesa americana. “Embora tenha o terceiro orçamento da União, o dinheiro destinado a manter os equipamentos atuais, o que cria um risco: sucateamento e dificuldade para aquisição de novos.”

Hoje, segundo dados de mercado, o Brasil gasta 1,6% do PIB com a indústria de defesa, um percentual abaixo do verificado tanto em nações ricas quanto nas emergentes: o Chile gasta 3,5%, os Estados Unidos, 4,8%, o Reino Unido, 2,7%, a China, 2,1%.

Além do baixo investimento no setor, os militares se ressentem da ameaça constante da tesoura do governo. Para manter o cumprimento das metas de superávit primário, o contingenciamento de recursos é comum. “O orçamento de defesa tem sido o mais afetado pelos contingenciamentos. Valores destinados a custeio e investimentos, na monta de R$ 15,9 bilhões, foram limitados em R$ 10 bilhões em 2010. Em 2011 a cena foi semelhante: o Ministério da Defesa sofreu um corte de 26,5% nas despesas referentes a custeios e investimentos, ou seja: R$ 4,0 bilhões a menos”, analisa Brustolin.

O pesquisador observa que, apesar dos cortes, ao final dos anos de 2010 e 2011, parte dos recursos foi redirecionada. “Isso evitou catástrofes maiores, pois esses contingenciamentos ocorrem, justamente, nos gastos com a manutenção dos equipamentos e nos investimentos e projetos. Mas o decreto 7.622, de 22 de novembro do ano passado, liberou parte dos recursos contingenciados. O total desembolsado ficou em pouco mais que 70% da dotação autorizada. Resumindo: somando-se ao contingenciamento, grande parte dos recursos previstos não foi executada”, explica o pesquisador.

Nesse contexto, surge uma preocupação entre militares, parlamentares e especialistas: a necessidade de fontes complementares de financiamento para que projetos como a implementação do Sistema de Monitoramento das Fronteiras (SisFron) possam sair do papel. “É preciso avançar na definição de um orçamento mais robusto para as Forças Armadas”, defende o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), presidente da Frente Parlamentar de Defesa Nacional.

Os projetos estruturantes são cruciais para o melhor monitoramento da fronteira terrestre, da costa brasileira e do espaço aéreo, em um momento em que o país se prepara para explorar o pré-sal e pleiteia um assento no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas. “Quanto mais pudermos implementar esses projetos com independência tecnológica, melhor para nós. Mas é preciso destacar que esses projetos são alocados no orçamento como investimentos. Por isso, todas as vezes em que houver contingenciamento, que sempre afeta investimentos e custeios, a produção de tecnologias fundamentais para o país estará sendo prejudicada”, ressalta Brustolin.

Trata-se de uma questão que também preocupa a indústria. “De um lado, se acena com uma MP que concede benefícios fiscais para investir no Brasil e transferir tecnologia. De outro, há preocupação de que não haja um fluxo contínuo e permanente de recursos para financiar esses projetos, que são vultosos”, afirma um empresário do setor.

As Forças Armadas trabalham na elaboração do Plano de Articulação e Equipamentos de Defesa (Paed), que contemplará projetos e prioridades das três forças em um horizonte de 20 anos, até 2031. A expectativa é de que em dois meses esse relatório possa estar pronto, segundo o general José Carlos de Nardi, chefe do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas. A prioridade dos investimentos será a defesa da Amazônia, das fronteiras brasileiras e da chamada Amazônia Azul. Estima-se no mercado que os investimentos em 20 anos possam superar R$ 100 bilhões.

Os investimentos em tecnologia militar podem ter grande impacto na sociedade civil, aponta Brustolin. O avião a jato e a internet são inovações desenvolvidas por militares que hoje são amplamente utilizadas por bilhões de pessoas. “Certamente a trajetória do Brasil é bastante diferente da dos Estados Unidos, no entanto, há importantes lições a serem aprendidas com os americanos que podem ser adaptadas às políticas públicas de inovação brasileiras”, afirma o pesquisador. Para ele, essa consideração baseia-se no fato de que o acompanhamento histórico dos gastos militares no Brasil demonstra os sucessivos cortes em investimentos e custeio, bem como a descontinuidade de programas científicos-tecnológicos, ao contrário do que ocorre nos EUA.

FONTE: Valor Econômico – 27/02/2012

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hamadjr
hamadjr
12 anos atrás

O artigo esta bem escrito no entanto não abordou a origem desse problema e pelo andar da carroça o aparelhamento das Forças Armadas do Brasil vai estar sempre condicionado ao futuro.

Luis
Luis
12 anos atrás

1) É preciso cortar regalias, principalmente as dos oficias- generais. Cortas festinhas e cerimoniais, que só servem para aparentar que tudo vai bem ;
2) Fazer um recadastramento e investigação das pensionistas do MD. Tem gente recebendo coisas que não era pra receber. Esse dinheiro vem dos nossos bolsos;
3) Procurar enxugar a folha de pagamento, tanto da parte de civis, quanto a de militares (esta, se realmente necessário);
4) Evitar planos mirabolantes que consumam a maior parte da verba disponível (subnuc, Nae, etc).

Marcos
Marcos
12 anos atrás

É a cara do Brasil!!!

Uitinã
Uitinã
12 anos atrás

Enquanto não cortar o pagamento abusivo de pensões que é pago atualmente, que abrange desde filhos e netos
enquanto não cortar mesmo as pensões pagas a velhos generais e seus familiares, o orçamento militar brasileiro e 11 maior do mundo a Índia esta colocada em 9 e reparem a diferença e qualidade de equipamentos.

Invincible
Invincible
12 anos atrás

Luis! Você falou muito bem.

Pra que tantos generais no Brasil? Pra que tanta gente nas FA?

Porque aposentadorias tão gordas?

Aí não adianta reclamar.

giordani1974
giordani1974
12 anos atrás

É por isso que “nefte paíf”, equipamento militar, só de prateleira. Qualquer coisa que dependa de investimentos contínuos, não sai do papel…e quando sai, acaba como o AMX…

Vejam que os investimentos do Chile, não são lá grandes coisas, mas são contínuos…

Porquê o braZil tem tantos generais?
É preciso centros de equitação?
E as eternas pensões? Das mocinhas que não casam e blá…blá…blá…