Quartel histórico no centro de SP está abandonado

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Janelas podres, paredes com rachaduras e telhados destruídos são cenário em local que, além do Exército e da PM, abrigou hospício

Rodrigo Brancatelli

vinheta-clipping-forte “Por aqui passaram os melhores soldados do Exército Brasileiro”, diz a frase pintada em vermelho no alto do portal da antiga sede do 2º Batalhão de Guardas, no Parque Dom Pedro II, centro de São Paulo. Por ali agora passam o abandono, a degradação e a negligência com um dos imóveis mais importantes da história paulistana. De símbolo da polícia paulista e do próprio Exército, o quartel se resume hoje a muito entulho, telhados quebrados, infiltrações, cupins, paredes prestes a ruir e memórias esquecidas. É um triste resumo do patrimônio de São Paulo, mais um daqueles bens tombados imperceptíveis, que estão ali mas ninguém se dá conta.

Os arcos, paredes, a capela e a quadra do local guardam capítulos essenciais da memória da cidade. Reza a lenda que o prédio do 2.º Batalhão de Guardas foi um presente de d. Pedro I a dona Domitila de Castro Canto e Mello, a marquesa de Santos. Quando chegava a São Paulo, o imperador dormia por ali e, possivelmente, encontrava-se com a marquesa. O endereço acabou mais tarde sendo transformado na sede de uma chácara da Várzea do Carmo, depois foi ocupado pelo Seminário das Educandas e anos depois pelo Hospício dos Alienados – onde chegou a morrer o poeta de Santo Amaro Paulo Eiró, em 1871.

Exército. Com o golpe militar em 1964, o quartel foi tomado pelo Exército, primeiro como sede da 7.ª Companhia de Guarda e depois do 2.º Batalhão de Guardas, reunindo cerca de 900 homens até 1992. A degradação começou a partir de1995, quando o quartel foi ocupado pelo 3.º Batalhão da Polícia de Choque do Estado de São Paulo.

A falta de investimentos e a velha receita de descaso com o patrimônio histórico foram pouco a pouco dilapidando a beleza do quartel, destruindo telhados, trazendo a ferrugem, criando infiltrações. Hoje, o prédio é apenas um arremedo de seu passado, um bocado de entulho e de paredes prestes a cair que guardam poucos vislumbres do charme do século 19. Também serve como um exemplo da degradação da região, igualmente esquecida nas últimas décadas.

Soldado. “Aquilo está à venda, mas ninguém quer comprar porque não vale a pena restaurar”, diz o gerente de loja Héveles Martinez, de 50 anos, soldado do 2.º Batalhão de Guardas em 1978. “Então o que está acontecendo é que estão esperando tudo cair de vez, para aí sim construir um espigão residencial. Desde 2004 eu chamo a atenção para o abandono do quartel, já tirei fotos, enviei carta para o governo, mas ninguém respondeu. Mesmo tombado pelo patrimônio histórico, é um monumento que corre o risco de virar pó.”

A degradação é vista de longe, até mesmo da Estação Dom Pedro II. Parte do telhado já caiu, o resto parece fadado ao mesmo destino durante uma futura chuva forte. Absolutamente todos os galpões aparecem deteriorados – o piso está forrado por pó de madeira, símbolo mais do que visível da ação dos cupins. Janelas estão podres, paredes exibem rachaduras que mais parecem cicatrizes gigantes. O assoalho da capela está afundando, bem como o piso da quadra do quartel – que já serviu para treinamentos do atleta João do Pulo, então 3.º sargento no 2.º Batalhão de Guardas.

A Polícia Militar afirmou que irá fazer um diagnóstico completo do imóvel, mas não há prazos para o restauro. O Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico do Estado (Condephaat) disse que já notificou a PM por falta de manutenção. “Eu ainda guardo lembranças sensacionais do quartel, o prédio respira história”, diz Martinez. “Hoje, só tenho desgosto, até chorei quando notei a situação dos galpões. É muito triste ver a maneira que trataram a nossa memória.”

CRONOLOGIA

Descaso com o patrimônio

1860
Seminário e hospício
Construído para ser sede de uma chácara, o imóvel é ocupado pelo Seminário das Educandas. Anos depois, passa a ser o Hospício dos Alienados, onde, em 1871, faleceu o poeta Paulo Eiró, de Santo Amaro

1930
Exército
O imóvel no Parque Dom Pedro passa à antiga Força Pública, mas com o golpe militar em 1964 é ocupado pelo Exército Brasileiro

1995
Decadência
O imóvel passa a pertencer ao 3.º Batalhão da Polícia de Choque do Estado de São Paulo. A Polícia Militar informou por meio de sua assessoria de imprensa que tem planos de restaurar o local

FONTE/FOTOS: O Estado de São Paulo, via resenha CCOMSEx/www.segundobg.com.br

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@MauroVS
@MauroVS
14 anos atrás

Ficou assim porque não é obra do arquiteto Niemeyer.

Mas em Brasilia no monumento JK circundado por uma foice, falta o martelo na mão de Juscelino. Diz a lenda que o martelo foi roubado por um petralha.

Rogério
Rogério
14 anos atrás

O GATE, COE e GOE usam as ruinas p/ treinamento, vivem explodindo coisas lá.

[]s

Tadeu
Tadeu
14 anos atrás

Verba com certeza há para tocar a obra.

joel
joel
14 anos atrás

Servi neste quartel, realmente é muito triste o quadro de abandono.

Rogério, acho improvável que o GATE ou o COE explodam alguma coisa la dento porque a estrutura é toda de madeira e não resistiria sem contar que é muito inflamável.

Abraços

Antonio M
Antonio M
14 anos atrás

Parece que no Rio, fechou um museu/associação de praças da 2ª guerra. Mas “fábricas” de cocaína e crack precisam ser fechadas à força senão multiplicam-se mais do que bactérias. Perto de minha casa uma senhora que abriu um salão de costura, para confeccionar roupas, fazer reparos etc. e o fazia bem e com bom preço fechou e só fiquei sabendo pois precisei consertar uma camisa e uma calça e quase quebrei a cara batendo na porta fechada! E perto de lá há vários botecos que nunca fecharam, inclusive um que ergueu muros na calçada, “jogou um brasilit” em cima e… Read more »

Galileu
Galileu
14 anos atrás

pior que não é o unico viu, conheço vários inclusive a minha antiga unidade, um prédio otimo, jogado as traças, o EB sempre teve esse costume de não dar a mínima a unidades tradicionais.

Uma pena……..e pra mim não é falta de dinheiro não é falta de organização e parcerias, minha unidade por ex. não foi fechada por falta de dinheiro e sim por falta de organização por parte do EB.

Wilson Figueiredo
Wilson Figueiredo
14 anos atrás

O problema é que verbas para restaurações neste país é quase um “monopólio” dos donos de igrejas antigas. Este quartel é patrimônio do país. As igrejas antigas são propriedades particular que, sabe-se lá, no Brasil tem estatus de prioridade com dinheiro público ao arrepio da Constituição que é bem clara quanto a separação do Estado e (todas) igreja.

marcelo
marcelo
14 anos atrás

quando eu tinha 7 anos eu via os soldados pagando castigo nesse quartel

Mauricio R.
Mauricio R.
14 anos atrás

Descaso ou vingança???

Rogério
Rogério
14 anos atrás

Joel eu vejo isso todos os dias. E com certeza isso vai cair mesmo.

[]s

Rogério
Rogério
14 anos atrás

Joel trabalho em um prédio ao lado, só em uma tarde foram nove explosões com bombas de efeito moral para simulação de invasão.

[]s

joel
joel
14 anos atrás

ah entendi granadas de efeito moral, obrigado epla informação.
Vi que eles usam a área de estacionamento interna para, antigo P8,para guardar viaturas que viraram sucata.
Abraços.

Roberto Bozzo
Roberto Bozzo
14 anos atrás

Passo ali quase todo dia pois moro ao lado do metro e vejo a degradação do local…a praça ao lado, à noite, fica cheia de mendingos e usuários de drogas… vi certa vez (a uns 8 anos) um estudo para reforma do local transformando-o em uma unidade de treinamento da GCM e a transformação dos arredores em parque, correndo ao lado do rio Tamanduateí; pelo projeto a GCM cuidaria da segurança do parque. Mas, como sempre, ficou só no projeto…

Strider
Strider
14 anos atrás

Que historia é esta de que com o “golpe” de 64 o Quartel foi tomado pelo Exército’ Como é que o Exército toma seu próprio quartel? Em 1946 alí já se achava aquartelado temporariamente uma bateria de um dos grupos de artilharia veterano da FEB…..
Faltam paginas nesta história….

WALTER MANOCCHI
WALTER MANOCCHI
14 anos atrás

Servi neste quartel(Grupo bandeirantes), em 1954. Me lembro do tenente Carvalho, Tenente Ferraz, dos soldados Quardia, Maurilio(que me ensinou boxe) e o Copernico. Eu éra artilheiro metralharo da 2ª Cia. Naquela época havia um comentário de estavamos prestes a embarcar para a Coreia(não sei se éra verdade), só sei que passamos muita confusão pela morte do Getulio. Éra bombas estourando em muitos lugares da cidade.