O prédio que matou 10 brasileiros
Dos 14 mortos confirmados até ontem entre os militares brasileiros no terremoto do Haiti, nada menos que 10 perderam a vida em um único local: o Ponto Forte 22 (uma espécie de posto avançado), mais popularmente conhecido como Casa Azul, em Porto Príncipe. O prédio ruiu na terça-feira, sepultando os soldados. Estive no local em abril de 2007, acompanhando as tropas brasileiras da Minustah, e me surpreendi com a quantidade de furos de bala espalhados pela construção – pintada, como o nome indica, de azul. Nos andares inferiores, uma pequena guarnição descansava. No piso superior, militares apontavam suas armas para Cité Soleil, um aglomerado de favelas à beira-mar, na época recém-pacificado. A tomada da Casa Azul pelos brasileiros, em janeiro daquele ano, foi, justamente, fundamental para pacificar Cité Soleil. Até então, o edifício de três andares era utilizado por gangues para dominar a principal estrada do país, a Rodovia Nacional 1.
– O prédio era mais alto do que os demais. De lá, as gangues disparavam contra alvos na estrada e dificultavam o trânsito das tropas – lembra o coronel Pedro Aurélio de Pessoa, comandante do Centro de Instrução de Operações de Paz Sergio Vieira de Mello.
Conquistada, a Casa Azul passou a ser uma base avançada estratégica, que abrigava em torno de 20 militares:
– Era um local que irradiava segurança para a população do entorno. Deixamos as marcas de tiros na fachada para que os habitantes não se esquecessem o motivo de estarmos lá – conta Pessoa.
Abalo histórico para o Exército
A força da natureza acabou gerando nos soldados brasileiros mais traumas do que todas as incursões militares realizadas após a II Guerra Mundial.
Nunca, em tempos de paz, o Exército do Brasil sofreu um revés como o provocado pelo terremoto no Haiti. Tanto que, ao visitar o Batalhão Brasileiro em Porto Príncipe, ontem, o ministro da Defesa Nelson Jobim ressaltou que “muitos estavam deprimidos pela perda de companheiros”.
Os 14 mortos, quatro desaparecidos e 14 feridos contabilizados pelo Exército são uma derrota histórica, para um inimigo contra o qual não há preparo bélico possível. Desde a última guerra mundial, quando o país perdeu mais de 400 militares na Itália em luta contra os nazistas, não morriam tantos pracinhas brasileiros em ação.
– Estamos no Haiti desde 2004, levando tiro, e nunca tivemos um combatente morto pelo inimigo, nunca fomos derrotados em combate. Para desastres climáticos, não há treino que prepare. Um militar não espera que o teto desabe sobre sua cabeça – desabafou o general da reserva Gilberto Figueiredo, presidente do Clube Militar, entidade porta-voz oficial das Forças Armadas.
O gaúcho Figueiredo está correto. O desastre provocado pelo terremoto não tem precedentes nem no Haiti, nem nas outras Missões de Paz nas quais o país se envolveu desde a II Guerra. Em Angola, onde soldados brasileiros permaneceram por três anos, o Brasil perdeu três militares – dois por malária, um abatido a tiros por saqueadores. Em Moçambique, não ocorreram baixas fatais, tampouco em Timor Leste, para ficar nas incursões recentes.
Nelson Düring, diretor do site especializado Defesanet.com.br, nota que a tragédia no Haiti acontece numa missão em que tudo deu certo para o Brasil. Ele diz que o pânico das Forças Armadas é ter de explicar à nação quando caixões com militares começarem a desembarcar.
– O curioso é que o túmulo de tantos soldados, agora, tenha sido o Ponto 22. Justamente o local da maior vitória brasileira no Haiti, o forte conquistado em fevereiro de 2007 às gangues, coroando a missão maior dos brasileiros, de dar segurança àquele povo – lamenta Düring.
Militares têm retorno adiado
Os 41 militares que estão lotados no Comando Militar do Sul e participam da missão da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti não retornarão ao Brasil no sábado, como previsto. Eles completaram os seis meses de missão no país e o comando preparava sua recepção no país, mas o terremoto que atingiu o Haiti na terça mudou os planos. Não há nova data prevista para o retorno.
O chefe da Comunicação Social do Comando Militar do Sul, coronel Sylvio Cardoso, disse que a permanência deve considerar que o grupo tem experiência no país, por integrar a Companhia de Engenharia Haiti.
FONTE: Zero Hora, via Resenha CCOMSEx e Notimp
FOTO: Portal sangueverdeoliva – Haiti – Operações de Manutenção da Paz (foto tirada em ocasião de visita de equipe do Domingão do Faustão e cantor de rap MV Bill, em março de 2009)
Honra a memória dos soldados. Eles defendiam o nome do Brasil com coragem.
Houve uma baixa na missão do Timor Leste, embora indireta, quando um militar brasileiro foi vítima do atentado terrorista à bomba em Bali.